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Revista Brasileira de Pneumologia Sanitária

versão impressa ISSN 1982-3258

Rev. Bras. Pneumol. Sanit. v.15 n.1 Rio de Janeiro dez. 2007

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Características da tuberculose em adolescentes: uma contribuição para o programa de controle

 

Characteristics of tuberculosis in adolescents: a contribution to the tuberculosis control program

 

 

Agnaldo José LopesI, Greice Maria Silva da ConceiçãoII, Jorge Luiz da RochaIII, José Manoel JansenIV, Kátia Telles NogueiraV, Roberto Amaury Carvalho dos SantosVI

IDoutorando em Medicina pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Médico pneumologista do Posto de Atendimento Médico Newton Bethlem da Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro
IIEstatística. Mestre em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais pela Escola Nacional de Ciências Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (ENCE/IBGE). Estatística do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (UCAM)
IIIMédico pneumologista do Posto de Atendimento Médico Newton Bethlem da Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro
IVDoutor em Pneumologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Membro Titular da Academia Nacional de Medicina. Professor Titular da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ)
VDoutora em Epidemiologia pelo Instituto de Medicina Social (UERJ). Especialista em Medicina de Adolescentes pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)
VIMédico Pediatra. Ex-residente do Núcleo de Estudos da Saúde do Adolescente (NESA) da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Trabalho realizado no Posto de Atendimento Médico Newton Bethlem da Secretaria Municipal de Saúde da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro e no Hospital Universitário Pedro Ernesto da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: Analisar as características demográficas, clínicas e laboratoriais da tuberculose-doença em adolescentes/adultos jovens, e compará-las com aquelas observadas em adultos.
MÉTODOS: Nesse estudo, avaliamos um grupo de 203 pacientes com tuberculose, dos quais 77 eram adolescentes/adultos jovens (grupo A) e 126 eram adultos (grupo B). Foram comparadas as seguintes variáveis: sexo, forma clínica, exame de escarro, teste tuberculínico, sorologia anti-HIV e tipo de desfecho.
RESULTADOS: Em ambos os grupos, a tuberculose foi mais prevalente no sexo masculino (62,3% e 50,8% dos pacientes dos grupos A e B, respectivamente, com p>0,05). A forma pulmonar foi a mais freqüente nos dois grupos, tendo sido diagnosticada em 79,2% dos indivíduos do grupo A e em 78,6% do grupo B (p>0,05). Dentre as formas extrapulmonares da enfermidade, a pleural foi mais comum nos indivíduos do grupo A (87,5% versus 51,9%, com p<0,05). Quanto aos resultados dos exames complementares, não houve diferença significativa entre os grupos. Os desfechos favorável e desfavorável foram iguais em ambos os grupos (p>0,05).
CONCLUSÃO: As características da tuberculose são semelhantes nos dois grupos, exceto pela maior freqüência de tuberculose pleural no grupo A.

Palavras-chave: Tuberculose; adolescentes; adultos


SUMMARY

OBJECTIVE: To assess the demographic, clinical and laboratorial characteristics of tuberculosis-disease's presentation in adolescents/young adults and compare them with those observed in adults.
METHODS: In this study, a group of 203 patients with tuberculosis was analyzed, from which 77 were adolescents/young adults (group A) and 126 adults (group B). Some variables have been collected such as gender, clinical presentation, sputum examination, tuberculinic skin test, anti-HIV sorology and follow-up.
RESULTS:
In both groups, tuberculosis was more prevalent at the male gender (62.3% and 50.8% of the patients from groups A and B, respectively, with p>0.05). The pulmonary form was the most frequent one in both groups and has been diagnosed in 79.2% of the individuals of group A and in 78.6% of the group B (p>0.05). Among the extrapulmonary forms of this disease, the pleural one was more common in individuals of group A (87.5% versus 51.9%, with p<0.05). There has not been significative difference between the groups, according to the results of the complementary exams. The favorable and unfavorable upshots were equal and it is similar both goups (p>0.05).
CONCLUSION: The characteristics of tuberculosis were similar in both groups, except for the major frequency of pleural tuberculosis in group A.

Key-words: Tuberculosis; adolescents; adults


 

 

INTRODUÇÃO

A tuberculose, doença tão antiga que quase se confunde com a própria história do homem, mantém-se como importante problema de saúde pública. As estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), atualmente, giram em torno de oito milhões de casos novos em todo o mundo, e quase dois milhões de óbitos ao ano.1

No Brasil, têm sido diagnosticados entre 80 e 90 mil casos novos, por ano, nos últimos 10 anos; isto corresponde a um coeficiente de incidência de 45,5/100.000 habitantes. Dentre as unidades federadas, o Rio de Janeiro é a que possui uma das situações mais preocupantes no país, tendo sido notificados em torno de 13 mil casos novos nos últimos anos, com coeficiente de incidência de 83,4/100.00 habitantes.2,3 Neste estado, a urbanização caótica, a elevada porcentagem da população vivendo em zona urbana – 96,4% em 2000, a mais alta do país – e as deficiências do sistema de saúde são prováveis justificativas para o elevado número de casos e a presença de um coeficiente de incidência bem acima daquele observado para o país.4

A forma clínica pulmonar com baciloscopia positiva é a que mais ocorre – em torno de 60% dos casos –, seguida por 25% de pulmonares sem confirmação bacteriológica e 15% de formas extrapulmonares. O sexo predominante é o masculino, com dois terços dos casos. Por faixa etária, o maior número encontra-se entre os adultos, especialmente aqueles da terceira década de vida.2,3

Nas crianças, a tuberculose-doença apresenta-se clinicamente de formas variadas e com quadro clínico pouco característico. Quanto aos adolescentes, ainda há poucos relatos de apresentação clínica e laboratorial da enfermidade; no entanto, estes são geralmente incluídos nos capítulos de tuberculose na infância, o que pode não ser um retrato fidedigno das características da doença na adolescência.1,5 Já nos adultos, a tuberculose é bem descrita, com evidências clínico-radiológicas e laboratoriais já estabelecidas.

Em relação às crianças, os adolescentes são mais susceptíveis a desenvolver tuberculose-doença, por causa das alterações hormonais e no metabolismo do cálcio que ocorrem durante esta fase do crescimento.6,7 O intervalo de tempo entre a infecção inicial e o aparecimento da doença é também menor para os adolescentes, quando comparado àquele observado em indivíduos de outras faixas etárias.6

O objetivo do presente estudo é descrever as características demográficas, clínicas e laboratoriais de um grupo de adolescentes com tuberculose, comparando-as com as de adultos. O conhecimento adquirido poderá contribuir para o delineamento de novas estratégias de controle da tuberculose na adolescência.

 

MÉTODOS

Foi realizado estudo transversal de uma amostra consecutiva de pacientes com tuberculose, atendida durante o período de novembro de 2002 a maio de 2007. Foram incluídos no estudo os pacientes que, neste período, receberam o diagnóstico e acompanhamento do Programa de Tuberculose de uma unidade de saúde pública da Prefeitura da Cidade do Rio de Janeiro (Posto de Atendimento Médico Newton Bethlem, localizado na área de Jacarepaguá).

Os pacientes foram convidados a participar do trabalho ao serem diagnosticados; nesta ocasião, assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

Considerou-se adolescente todo indivíduo com idade entre 10 e 19 anos, e adulto jovem aquele entre 20 e 24 anos, que são as definições adotadas pela OMS.1,8 Compararam-se as características dos adolescentes e adultos jovens com tuberculose (grupo A) com aquelas dos adultos também com tuberculose (grupo B), indivíduos com idade de 25 a 39 anos, por ser esta a faixa etária de maior incidência da tuberculose tanto do Rio de Janeiro quanto no Brasil.2,3

Caso de tuberculose foi aquele que teve o diagnóstico confirmado por meio de baciloscopia e/ou cultura para Mycobacterium tuberculosis, ou que apresentava evidências clínico-radiológicas e epidemiológicas de tuberculose e que, após a prescrição do esquema terapêutico, evoluiu com melhora significativa sem ter sido diagnosticada outra enfermidade. Para a tuberculose pulmonar, definiram-se duas formas clínicas da doença: 1) pulmonar positiva, para os casos com confirmação bacteriológica no escarro; 2) pulmonar negativa, para os casos sem confirmação bacteriológica no escarro.2,3 Para a extrapulmonar, considerou-se os indivíduos que apresentaram tuberculose localizada em outros sítios não pulmonares, diagnosticada por bacteriologia, histopatologia ou suspeita clínica.

As características estudadas foram: demográficas (sexo e idade), clínicas (forma da doença, tipo de tratamento, motivo do encerramento) e laboratoriais (baciloscopia e cultura do escarro, teste tuberculínico, sorologia anti-HIV).

Para o teste tuberculínico, considerou-se positivo aquele com induração ≥10mm, com exceção para os portadores do HIV; nestes últimos, o critério adotado para a positividade do teste foi ≥5mm.

A significância estatística das associações encontradas foi estabelecida através do teste do Qui-quadrado e considerado como significado estatístico quando valores de p<0,05. Para a criação do banco de dados e análise estatística, utilizou-se o programa SPSS 15.

 

RESULTADOS

No estudo, foram incluídos 203 pacientes com tuberculose, sendo 77 adolescentes e adultos jovens (Grupo A) e 126 adultos (Grupo B). Dentre os pacientes do grupo A, 24 tinham idade entre 10 e 19 anos (adolescentes) e 53 tinham idade entre 20 e 24 anos (adultos jovens).

O sexo mais prevalente foi o masculino, representando 62,3% dos pacientes do grupo A e 50,8% dos indivíduos do grupo B (Figura 1). Na análise desta variável, não houve diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos (p = 0,109).

 

 

A idade dos adolescentes/adultos jovens variou de 12 a 24 anos (média de 20,2 ± 3,03 anos), sendo que 24 deles estavam na faixa etária entre 10 e 19 anos e 53 entre 20 e 24 anos. Já a idade dos adultos oscilou de 25 a 39 anos (média de 32,1 ± 4,37 anos). A quase totalidade dos pacientes de ambos os grupos era proveniente de classes sociais menos favorecidas, refletindo a localização estratégica desta unidade de saúde pública.

Quanto à forma clínica de apresentação da tuberculose, não se observou diferença significante entre os grupos (p = 0,913). A forma pulmonar da tuberculose foi a mais freqüente nas duas faixas etárias estudadas, tendo sido diagnosticada em 61 adolescentes/adultos jovens (79,2%) e em 99 adultos (78,6%) (Figura 2).

 

 

A distribuição dos pacientes, de acordo com a forma pulmonar da tuberculose (positiva ou negativa), está demonstrada na Tabela 1. Para esta variável, também não foi notada diferença estatisticamente significativa entre os grupos A e B (p = 0,523).

 

 

As Figuras 3 e 4 mostram as radiografias de tórax de dois casos de tuberculose pulmonar em adolescentes – ambos com baciloscopia de escarro positiva – sendo um com apresentação radiológica típica e outro com apresentação radiológica atípica.

 

 

 

 

Com relação às formas extrapulmonares da doença, estas ocorreram em 16 indivíduos do grupo A (20,8%) e em 27 do grupo B (21,4%). A confirmação histopatológica foi obtida em quatro casos do grupo A e em 14 casos do grupo B, enquanto a confirmação bacteriológica foi feita em um caso do grupo A e em três casos do grupo B. Apesar da tuberculose pleural ter sido a forma extrapulmonar mais freqüente em ambos os grupos, esta mostrou maior prevalência nos adolescentes/adultos jovens do que naqueles entre 25 e 39 anos de idade (87,5% versus 51,9%, com p<0,05). A distribuição desses pacientes, de acordo com as formas extrapulmonares da tuberculose, está demonstrada na Figura 5.

 

 

Dentre os que realizaram a sorologia anti-HIV, observou-se positividade no exame em um paciente (1,3%) do grupo A e em nove (7,1%) do grupo B (p = 0,119). No escarro, a baciloscopia foi positiva em 35 adolescentes/adultos jovens (45,5%) e em 59 adultos (46,8%), sem diferença estatisticamente significante (p = 0,937). Com relação ao resultado do teste tuberculínico, o exame foi positivo em 12 (15,6%) adolescentes/adultos jovens e 19 (15,1%) adultos (p = 0,744). A Tabela 2 mostra a distribuição dos pacientes de acordo com os exames complementares, assim como o p-valor.

 

 

Nessa casuística apenas um paciente de cada grupo evoluiu para o óbito, enquanto o abandono de tratamento ocorreu em sete doentes do grupo A (9,1%) e quatro do grupo B (3,2%). Dentre os adolescentes/adultos jovens, três tinham condições sociais relevantes associadas, sendo um de "população de rua", um usuário de drogas ilícitas e um ex-presidiário; esses três pacientes abandonaram o tratamento.

Na amostra estudada, a taxa de cura foi de 88,3% e 94,4% nos indivíduos dos grupos A e B, respectivamente. Quando se agruparam os desfechos em favorável (alta por cura ou por completar o tratamento) e desfavorável (óbito, abandono ou falência de tratamento), os grupos permaneceram sem diferença estatisticamente significativa (p = 0,116), conforme mostra a Tabela 3.

 

 

DISCUSSÃO

Estudos transversais são de grande valia para os serviços de saúde, uma vez que proporcionam dados gerais correlações sobre as condições da população analisada, podendo produzir medidas de prevalência de doenças. Estas investigações podem colaborar na idealização e surgimento novas estratégias e programas para o controle da doença estudada.9

Devido a sua importância em saúde pública, a tuberculose – uma doença milenar – há muito tempo vem sendo estudada em todos os seus aspectos. Embora já esteja largamente descrita a apresentação da tuberculose em adultos idosos, ainda dispomos de poucos estudos demonstrando características desta enfermidade entre os adolescentes.1

A tuberculose no adolescente é um assunto de cunho sócio-econômico e sanitário em todo o mundo, apesar do pouco conhecimento a seu respeito. Até o momento, a maioria dos capítulos de livro publicados sobre o assunto refere a apresentação da tuberculose no adolescente como sendo mais próxima daquela descrita na infância.5 Entretanto, presente casuística – que comparou adolescentes e adultos jovens (grupo A) versus adultos (grupo B) com tuberculose, uma área da periferia da cidade do Rio de Janeiro –, verificou-se que a apresentação clínica e laboratorial e o desfecho foram semelhantes entre as duas faixas etárias estudadas.

A adolescência é o período em que ocorrem mudanças endócrino-metabólicas inerentes a essa fase da vida como, por exemplo, modificações no metabolismo de cálcio e proteínas, alterações hormonais diversas, ocorrência do estirão puberal, entre outras.6,10 Isto aumenta a susceptibilidade do adolescente a desenvolver tuberculose. Pesquisas identificaram até mesmo a possibilidade de que efeitos endócrinos poderiam alterar a capacidade do organismo do adolescente em controlar o bacilo da tuberculose, mediante modificações observadas no sistema imune.11

Na série de adolescentes e adultos jovens estudada, a tuberculose foi mais freqüente no sexo masculino, o que condiz com a literatura consultada.1 Ademais, essa predominância da doença no sexo masculino (62,3%) é semelhante à distribuição na população geral de tuberculose do Estado do Rio de Janeiro (67,4%).4 A maior prevalência em homens pode ser atribuída a fatores biológicos, incluindo os hábitos de vida.12

De acordo com os resultados da presente casuística, a forma clínica mais freqüente da tuberculose em ambos os grupos foi a pulmonar, fato este também observado em todas as outras idades.10 Provavelmente, aquelas alterações hormonais citadas anteriormente também sejam responsáveis pela evidência de que a tuberculose em adolescentes apresenta-se mais parecida à forma pulmonar do adulto, isto é, com infiltrados pulmonares nos terços superiores, cavidades, disseminação brônquica e mais sintomas respiratórios. Já na infância, esses sintomas são menos presentes e o quadro é mais arrastado. No adolescente, assim como no adulto, sintomas como hemoptóicos e sudorese noturna estão muitas vezes presentes, porém nas crianças são incomuns.

Em alguns trabalhos, as formas extrapulmonares aumentaram de incidência com o avançar da idade, o que não foi notado em nosso estudo.13 Entretanto, verificamos que a tuberculose pleural foi muito mais freqüente entre os adolescentes e adultos jovens do que entre os adultos (87,5% versus 51,9% das formas extrapulmonares); a tuberculose pleural pode resultar da ruptura de um foco subpleural primário ou ser secundária a uma manisfestação de hipersensibilidade ao bacilo.14

No presente estudo, chama a atenção o fato do grupo A só ter apresentado as formas pleural e linfonodal da tuberculose extrapulmonar. Isto é interessante uma vez que ambas as formas são altamente sugestivas de progressão da doença após a primoinfecção pelo M. tuberculosis. A tuberculose primária resulta da progressão do complexo primário que se desenvolve nos primeiros anos após a primoinfecção e, em geral, acontece antes que se estabeleça a maturidade das defesas imunológicas.14

Na avaliação laboratorial dos grupos A e B, encontramos taxas semelhantes de baciloscopia e cultura positivas no escarro, reação ao teste tuberculínico e exames não realizados, sem diferenças estatisticamente significantes. Talvez isso seja justificado pelo fato de que nos adolescentes, assim como nos adultos, é mais fácil colher secreções para a identificação do bacilo; já nas crianças isso não acontece, sendo mais difícil o diagnóstico laboratorial.

O HIV tem sido apontado como um dos fatores responsáveis pelo aumento do número de casos de tuberculose no mundo.8 Entretanto, conforme mostram os nossos resultados, foi diagnosticado apenas um caso de aids entre os adolescentes e adultos jovens, demonstrando que este não é um fator de impacto na magnitude da tuberculose entre os 10 e 24 anos de idade. Vale ressaltar que a amostra de indivíduos nessa faixa etária foi pequena, o que impede a extrapolação deste achado para a população de adolescentes como um todo.

Nessa série de dados estudados, os motivos de desfecho manteve-se semelhante nos dois grupos estudados, sem diferença estatisticamente significante. No entanto, mesmo tendo o grupo A um menor número de indivíduos do que o grupo B, observamos mais casos de abandono de tratamento entre os adolescentes e adultos jovens. Talvez isto seja justificado pelo fato da adolescência ser um período de profundas mudanças psicossociais e de maior labilidade emocional.15 Este é um fato que merece maiores estudos.

Alguns estudos mostraram que o apoio e a participação dos pais durante o período de tratamento da tuberculose auxilia na aderência à terapêutica, estando este fato também relacionado à presença de auto-estima no adolescente.16-18 Além do apoio familiar, é importante que o adolescente com tuberculose tenha senso de autonomia, o que pode reduzir a taxa de abandono.19

É pertinente uma análise crítica dos resultados e das limitações do presente estudo. Uma delas inclui o fato de não termos obtido uma amostra de crianças com tuberculose, uma vez que isto permitiria uma comparação direta com os dados de adolescentes e adultos jovens. Isso seria interessante, visto que a descrição de tuberculose em adolescente é freqüentemente incluída na literatura junto com a tuberculose infantil. Outras limitações são o número pequeno de pacientes com determinadas condições (como a forma pleural da tuberculose e a co-infecção pelo HIV) e o perfil populacional da amostra (indivíduos de classes sociais menos favorecidas), o que impossibilita a extrapolação de nossos resultados.

Em conclusão, o presente estudo mostra que a apresentação clínica e laboratorial da tuberculose é bastante semelhante entre o grupo de adolescentes/adultos jovens e o grupo de adultos, com exceção da maior freqüência de tuberculose pleural na faixa etária mais baixa. O abandono do tratamento, detectado principalmente entre os adolescentes/adultos jovens, é um dado fundamental para as estratégias que visam obter uma maior aderência à terapia antituberculose. Portanto, faz-se necessária uma maior atenção de base psicológica aos adolescentes, tanto pela equipe médica quanto pelos familiares, fornecendo-lhes informações mais detalhadas sobre a doença e o seu tratamento.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência:
Agnaldo José Lopes.
Rua José do Patrocínio, 290/405, Grajaú
CEP: 20560-160,
Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Tel: 55 21 2576 2030.
E-mail:phel.lop@uol.com.br

Recebido em 2/4/2007 e
aceito, após revisão, em 27/04/2007