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Revista Brasileira de Pneumologia Sanitária

versión impresa ISSN 1982-3258

Rev. Bras. Pneumol. Sanit. v.15 n.1 Rio de Janeiro dic. 2007

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Avaliação de implantação do Programa de Controle da Tuberculose no município de Niterói/RJ

 

Evaluation of the Implementation of Tuberculosis Control Program in Niterói, state of Rio de Janeiro, Brazil

 

 

Luisa Gonçalves Dutra de OliveiraI; Sonia NatalII

IMestre em Saúde Pública, Instituto de Saúde da Comunidade (UFF), Instituto Estadual de Doenças do Tórax Ary Parreiras (SESDEC/RJ), Fundação Ataulpho de Paiva (Projeto Fundo Global TB-Brasil)
IIDoutora em Saúde Pública, Grupo de Estudos de Gestão e Avaliação em Saúde do Instituto Materno Infantil Prof. Fernando Figueira (GEAS/IMIP), Grupo de Pesquisas Avaliação de situação de processos endêmicos e de seus programas de controle (ENSP/Fiocruz), Consultora Técnica em Avaliação da Coordenação Geral de Desenvolvimento da Epidemiologia em Serviço/SVS/MS, Fundação Ataulpho de Paiva (Projeto Fundo Global TB-Brasil). Este estudo foi selecionado pelo Edital MCT-CNPq/MS-DAB/SAS no 49/2005, obtendo apoio para dissertação de mestrado

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Uma pesquisa avaliativa foi realizada no município de Niterói, região metropolitana do Rio de Janeiro, com o objetivo de conhecer a integração entre a Atenção Básica (AB) e as ações de controle de endemias e o grau de implantação dessas ações no município. Entre elas, as ações de controle da tuberculose foram escolhidas como a condição traçadora, devido à persistência da tuberculose como um importante problema de saúde pública no Brasil, especialmente nos grandes centros urbanos, onde ocorrem as maiores taxas de incidência. A Estratégia de Saúde da Família (ESF), por ser considerada o eixo integrador das ações da AB, está fortemente relacionada às ações de controle da tuberculose. Foram desenvolvidos o modelo lógico do Programa de Controle da Tuberculose (PCT) integrado à ESF e o modelo teórico de avaliação. Para operacionalizar os modelos de avaliação, utilizou-se o estudo de caso. A unidade de análise escolhida foi a Fundação Municipal de Saúde de Niterói. Para a coleta das evidências, foram selecionadas duas policlínicas e um módulo do Programa Médico de Família que diagnosticam, acompanham e tratam pacientes acometidos de tuberculose. Os resultados mostram que a integração entre os programas se dá de maneira assistemática e que a implantação do PCT é parcial nas unidades estudadas. A proporção de casos de tuberculose acompanhada pelas equipes da ESF foi de pouco mais que 10% do total de casos do município, enquanto que nas duas policlínicas estudadas essa proporção foi de 46,17%.

Palavras-chave: Avaliação; Estudo de caso; Integração de Programas de Atenção Básica; Tuberculose; Estratégia de Saúde da Família.


SUMMARY

An evaluative research was conducted in the city of Niteroi, in the metropolitan area of Rio de Janeiro. The objective of this study was to assess the integration between the Basic Attention Program (BAP) and endemics control actions, and to estimate the level at which the latter have been established in the municipality. Among those actions, the tuberculosis control actions were selected as a tracer condition, due to persistence of tuberculosis as a major public health problem in Brazil, especially in inner cities, where incidence rates are highest. The Family Health Strategy (FHS) is strongly related with tuberculosis control actions because it is considered to be the unifying element of BAP. The logic model of Tuberculosis Control Program (TCP) integrated with FHS and the evaluation theoretical model were developed. A case study approach was used for making the assessment models operational. The analysis unit chosen was the Health Municipal Foundation of Niteroi. For collection of evidences, two policlinics and one module of the Family Doctor Program, where tuberculosis cases are diagnosed, treated and followed up, were chosen. The results show that the integration between the programs is unsystematic and that the implementation of the TCP is only partial in the units studied. The proportion of tuberculosis cases registered by ESF teams is slightly above 10% of the total tuberculosis cases in the municipal area. This proportion is 46,7% in the two policlinics chosen.

Key-words: Evaluation; Case study; Integration of Basic Health Attention Program; Tuberculosis; Family Health Strategy


 

 

INTRODUÇÃO

A tuberculose, doença que acomete o homem há milhares de anos, persiste ainda hoje como um problema de saúde pública relevante, ainda que conte com eficaz tratamento medicamentoso há muitos anos.

O Brasil encontra-se entre os 22 países onde 80% dos casos mundiais da doença ocorrem, e o Rio de Janeiro destaca-se como o estado com maior incidência, 89,5/ 100.000 habitantes no ano de 2003. Sua região metropolitana possui os piores índices, correspondendo a 86% dos casos notificados.1

Os planos de controle da tuberculose e as estratégias traçadas para combater a endemia têm buscado aumentar a taxa de cura e diminuir o abandono de tratamento, interrompendo assim a transmissão da doença. Nos últimos anos merece destaque a estratégia DOTS (Directly Observed Therapy, Short-course) que propõe a melhoria das condições para diagnóstico laboratorial, o tratamento sob supervisão com fornecimento contínuo dos fármacos e um sistema de informação e registro capaz de monitorar a evolução do programa.2

O Programa de Controle da Tuberculose (PCT) tem sua normatização bem definida no Brasil e é executado em todas as esferas governamentais. A Secretaria de Vigilância em Saúde, do Ministério da Saúde, propõe a união das ações de vigilância, controle e prevenção da tuberculose e, para isso, a integração entre os diversos programas.3

A estratégia de estender o combate à tuberculose a toda a rede de serviços de saúde visa garantir o acesso ao diagnóstico e tratamento. A integração do PCT com outros programas, como o Programa de Saúde da Família (PSF), é fundamental para o alcance das metas atuais, que são: localizar no mínimo 70% dos casos estimados anualmente e curar no mínimo 85% destes.1 Entretanto, essa estratégia é de difícil implantação nas regiões metropolitanas.

A avaliação de práticas e programas de saúde prevê a avaliação da estrutura, do processo e dos resultados da assistência à saúde. Para avaliar as ações de controle da tuberculose no município de Niterói foram consideradas a estrutura e as atividades desenvolvidas no diagnóstico e tratamento dos doentes.

Niterói, município da região metropolitana do estado do Rio de Janeiro, conta com o Programa Médico de Família (PMF) desde 1991. O município é considerado prioritário para o desenvolvimento de ações destinadas a fortalecer o PCT.

Em 2003, a população de Niterói era de 466.630 habitantes, a taxa de incidência de tuberculose de 83,4/ 100.000 habitantes,4 o coeficiente de mortalidade por tuberculose de 4,9/100.000 habitantes, e o percentual de óbitos de 6,6% dos casos novos (2003).

O PMF de Niterói busca a reorientação do modelo local de atenção à saúde, com a cobertura de áreas não assistidas anteriormente e a hierarquização da rede de assistência. O processo de trabalho visa a humanização das relações entre profissionais e usuários, melhor acesso, definição de cobertura e metas de controle de agravos à saúde. "A ênfase está na prevenção de doenças e promoção da saúde, além da articulação com os demais níveis de assistência ou outros setores que interferem com a saúde". (p. 62)5

A gestão do PMF é feita pelas associações de moradores dos bairros onde os módulos são implantados, inclusive a contratação de profissionais, pagos com o repasse de verbas do município. Cada equipe é composta por um médico e um auxiliar de enfermagem, responsáveis por cerca de 250 famílias ou 1.000 pessoas. A equipe de supervisão é composta por ginecologista, clínico geral, pediatra, profissional de saúde mental, assistente social, enfermeiro e sanitarista.5

A partir de 1998, o PMF integrou-se ao PCT do município, participando de treinamento para realizar as ações de manejo de caso. Mascarenhas5 refere-se ao Relatório do PMF, de 1999, que apresenta como resultado: "observa-se a redução de mortes por causas evitáveis, como as doenças infecciosas, em algumas áreas com maior tempo de implantação, mas registra-se aumento da incidência de hanseníase e tuberculose, devido ao diagnóstico precoce e novos casos identificados destas doenças". (p. 67)

No período de 2000 a 2003, o encerramento dos casos de tuberculose residentes em Niterói mostrou um aumento na taxa de cura de 59,8 para 72,5% e uma diminuição do percentual de abandono de 18,3 para 15,8%, embora essa taxa, em 2002, tenha sido de 21,4%. Os encerramentos por óbito variaram de 6,4% em 2000 a 3,5% em 2002, sendo o último resultado registrado, o de 2003, de 4,9%.(SINAN / FMS Niterói) Destaca-se que, apesar do incremento nas taxas de cura, abandono e redução da letalidade, elas permanecem abaixo das metas do PCT: cura em 85% dos casos ou mais, abandono menor que 10% e letalidade abaixo de 5%.6

Diante desse quadro, o objetivo deste estudo foi o de avaliar o grau de implantação do Programa de Controle da Tuberculose no município de Niterói, considerando os diversos componentes da intervenção e a relação entre as atividades do programa e o contexto em que são realizadas, a fim de compreender os efeitos produzidos. Neste cenário, tornou-se fundamental conhecer a integração entre as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e as Unidades de Saúde da Família (USF), pressupondo-se que essa relação fosse complementar, e, assim, melhorasse o desenvolvimento das atividades do programa.

 

MÉTODO

A avaliação de implantação, realizada por meio de estudo de caso único com abordagens quantitativa e qualitativa, utilizou o Modelo Lógico de Avaliação. A utilização de modelos lógicos é uma das técnicas empregadas no planejamento e na análise de informações coletadas em um estudo de caso. Baseia-se na apresentação de eventos de forma encadeada, com padrão de causa-efeito, de acordo com a teoria existente.7 A Figura 1 apresenta o Modelo Lógico do PCT integrado à ESF, adaptado do proposto pelo CDC8.

 

 

O Modelo Lógico do Programa (MLP), construído com base na teoria dos programas, serve de parâmetro para comparação dos eventos observados com os "eventos teoricamente previstos", e para a construção do Modelo Teórico de Avaliação (MTA). O Modelo Lógico do PCT integrado à ESF tem como componentes os insumos, as atividades, os produtos, os resultados e o impacto. Desta forma, avalia-se se os recursos e serviços oferecidos são adequados e empregados de forma a atingir os resultados esperados. Os resultados obtidos são então comparados aos resultados alcançados.9 Para este modelo (Figura 1), as atividades apontadas envolveram as metas do programa, a Vigilância Epidemiológica, o apoio laboratorial e a assistência propriamente dita no nível da Atenção Básica, considerando principalmente o diagnóstico e o tratamento, a busca de casos, a notificação e os registros.

O estudo, realizado no município de Niterói no ano de 2006, teve como unidades de saúde escolhidas para a coleta de dados as duas policlínicas com maior número de usuários acometidos de tuberculose em tratamento e um módulo do PMF que tinha usuários em tratamento e fazia parte da área de abrangência de uma das policlínicas selecionadas.

Os dados primários foram coletados por meio de entrevistas, questionários e observação participante, com base em instrumentos estruturados. As entrevistas foram realizadas com usuários das unidades de saúde, profissionais de saúde que trabalhavam nos serviços selecionados e informantes chave, que foram definidos como gerentes do PCT e da ESF do município, supervisores, diretores das unidades, profissionais responsáveis pela Vigilância Epidemiológica das unidades e coordenador da Vigilância em Saúde do município.

As fontes de informação dos dados secundários foram: SINAN (Sistema Nacional de Agravos de Notificação) Municipal, livro de registro e acompanhamento de pacientes ("livro preto"), fichas de notificação, prontuários e livros de registro próprios de algumas unidades.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da ENSP/Fiocruz. As informações foram coletadas com consentimento prévio e autorizado, resguardados o anonimato e a privacidade do informante. Os participantes foram informados sobre os objetivos da pesquisa e sobre o uso exclusivo, para este estudo, das informações coletadas.

Para garantir a confiabilidade, validade e interpretação das informações coletadas foi utilizado o método de avaliação rápida para sistematizar e aumentar o rendimento da coleta de dados. O método de avaliação rápida (Rapid Evaluation Methods – REM), que proporciona resultados rápidos e úteis para tomada de decisões, tem como principais características a ênfase na observação de campo com aquisição de informações de diferentes níveis, o seguimento de um padrão hierárquico que mostre a estrutura administrativa dos serviços, maior enfoque na quantidade e qualidade dos serviços do que no estado de saúde, e resultados rápidos e úteis para decisões gerenciais.10

As dimensões utilizadas no Modelo Teórico de Avaliação foram o contexto externo, o contexto organizacional, a implementação das ações e os efeitos das mesmas (Figura 2). Cada dimensão foi subdivida em categorias, considerando os componentes do programa que estão associados à melhor resolutividade das ações de controle da tuberculose. Foram criados indicadores para o julgamento do nível de implementação do PCT e sua integração com a ESF, através de uma Matriz de Julgamento, apresentada na Tabela 1. A qualidade dos serviços de saúde neste estudo foi considerada como a execução das atividades de acordo com o estabelecido no programa nacional. A medida de sucesso da integração entre o PCT e o PMF no controle da tuberculose no município foi o desenvolvimento das ações de diagnóstico e supervisão do tratamento da doença de maneira eficaz.

 

 

 

 

RESULTADOS

Os dados analisados foram consolidados na Matriz de Julgamento, apresentada nas Tabelas 2, 3, 4 e 5, por cada dimensão estudada.

 

 

 

 

 

 

 

 

CONTEXTO EXTERNO

Niterói é um município com alta densidade demográfica e com 11,06% de sua população vivendo em aglomerados subnormais.11 A cobertura dos serviços públicos de saúde compreende 40% das unidades de saúde sem internação e 21,62% dos hospitais. O PMF atende 28% da população total do município.

Os indicadores municipais de alfabetização, população com 8 ou mais anos de estudo e com renda superior a cinco salários mínimos têm proporções superiores aos nacionais e aos do estado do Rio de Janeiro. Quanto aos recursos financeiros aplicados em saúde, Niterói tem aumentado progressivamente a proporção de recursos próprios com esta finalidade, embora tenha sofrido redução gradual da participação percentual de recursos transferidos pelo SUS.

 

CONTEXTO ORGANIZACIONAL

O PCT do município é parte da Coordenação de Vigilância em Saúde (COVIG), subordinada, por sua vez, à Vice-Presidência de Atenção Coletiva, Ambulatorial e de Família (VIPACAF) da Fundação Municipal de Saúde (FMS). O Programa Médico de Família tem gestão compartilhada entre a FMS e a Federação de Associações de Moradores de Niterói, não fazendo parte da estrutura administrativa oficial da FMS. Tem sido relatada a ocorrência de conflitos entre os profissionais e as associações de moradores, que aí têm o duplo papel de empregador e usuário.

O município conta com 08 unidades onde há tratamento ambulatorial de tuberculose (Unidades Básicas de Saúde ou Policlínicas), o que corresponde a 44,4% das unidades de atenção básica e de média complexidade da rede municipal. Todas as unidades contam com médicos, enfermeiros, auxiliares de enfermagem, assistentes sociais e profissionais no setor de Vigilância Epidemiológica. Esses profissionais nem sempre são exclusivos do programa, podendo atender outros setores nas unidades. Os módulos do PMF são 31 e todos possuem profissionais capacitados (médicos e auxiliares de enfermagem) para acompanhar os casos de tuberculose na sua área adscrita, dentro dos critérios estabelecidos para o primeiro nível de atendimento: casos pulmonares, bacilíferos confirmados, sem outros agravos associados. O tratamento supervisionado foi apontado como a principal estratégia para evitar o abandono de tratamento. Verificamos que essa forma de administração do tratamento foi mais oferecida no PMF e que houve descontinuidade do incentivo financeiro para os pacientes submetidos a ela. O hospital de referência para internação é o Instituto Estadual de Doenças do Tórax Ary Parreiras (IETAP) onde também se situa o ambulatório de pacientes com tuberculose MDR (resistente a múltiplas drogas), subordinado ao Ministério da Saúde através do Centro de Referência Professor Hélio Fraga (CRPHF / Rio de Janeiro). O Hospital Estadual Azevedo Lima (HEAL) e o Hospital Universitário Antonio Pedro (HUAP) também dispõem de alguns leitos onde é possível a internação de pessoas com tuberculose. Os laboratórios de análises clínicas de referência são o da UBS João da Silva Vizella e o Miguelote Viana, ambos municipais, localizados nos bairros Barreto e Santa Rosa, respectivamente.

Os coordenadores e gerentes dos programas, profissionais qualificados e experientes, não têm participação na gestão dos recursos destinados à saúde no município. Suas participações limitam-se à decisão sobre a utilização dos recursos dirigidos aos programas. A proporção de recursos federais, estaduais e municipais para o controle da tuberculose não é do conhecimento das coordenações.

Nenhum dos profissionais gestores do PCT ou do PMF toma parte do Conselho Municipal de Saúde como membro. Participam desta instância através do fornecimento de informações, como forma de instrumentalização dos conselheiros.

As atividades de Vigilância Epidemiológica são realizadas no nível central pela COVIG, onde os dados são computados no Sistema Nacional de Agravos de Notificação (SINAN). As informações do PMF vão também para o Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB). Não há integração entre as informações no nível das coordenações dos programas.

A articulação com grupos ou segmentos sociais organizados voltados para atuar no controle da tuberculose não acontece de forma sistematizada no município.

O planejamento das ações do PCT não é realizado em conjunto com o PMF, embora isso possa ocorrer pontualmente em alguns casos. As atividades de capacitação e treinamento fazem parte da rotina das equipes de PMF. Além disso, informações são divulgadas em reunião trimestrais de grupos de módulos. Para os profissionais das unidades de saúde tradicionais, as atividades de educação continuada são oferecidas esporadicamente.

A supervisão do PCT era realizada por um único profissional para toda a rede na época deste estudo. Isso prejudicava o cumprimento do cronograma. Os módulos do PMF contam com equipe de supervisão que comparece semanalmente ao módulo.

A emissão de relatórios não é realizada de forma conjunta pelo PCT e PMF. Cada um deles pode, porém, fornecer dados para que o outro inclua em seu relatório. A avaliação do sistema de informação também ocorre de forma separada entre os programas. A utilização das informações para tomada de decisão em conjunto acontece através da comunicação direta e contínua dos coordenadores e gerentes, embora não seja sistematizada.

 

CONTEXTO DE IMPLANTAÇÃO

A estrutura física, os recursos e a forma de acomodação apresentaram diferenças entre as unidades. Apenas uma das unidades estudadas tinha setor específico para atendimento de tuberculose. As salas de espera nas demais eram compartilhadas com outros usuários. Alguns consultórios eram pequenos e com ventilação precária. A situação da estrutura física e de recursos materiais mostrou-se melhor nas policlínicas. Os recursos humanos são escassos em ambos os programas, se considerarmos as inúmeras atividades a serem desenvolvidas. Apenas em uma das unidades havia profissionais dedicados exclusivamente ao PCT.

A acessibilidade está garantida principalmente no módulo do PMF que se encontra próximo à clientela que atende. Nas policlínicas a distância percorrida pelos usuários também não é longa, e elas se localizam em áreas de circulação de transporte coletivo. O tempo de espera não foi considerado um fator problemático, os usuários eram atendidos sempre pelo mesmo médico e os atendimentos não agendados que se faziam necessários eram providenciados. Nenhuma das unidades tem horário de atendimento ampliado.

A oferta de exame baciloscópico é realizada em todas as unidades. Há variação quanto ao tempo de espera para o resultado, podendo ser de 1 dia a 3 semanas, e, também, quanto à decisão do profissional em iniciar o tratamento sem o resultado da baciloscopia.

A busca de casos não é atividade de rotina em nenhuma das unidades, sendo realizada a partir de alguns casos diagnosticados ou solicitações.

O PMF administra os medicamentos para tuberculose de forma supervisionada em todos os casos que acompanha. Já nas policlínicas, esta forma de tratamento alcançou menos de 10% dos casos acompanhados. A falta de recursos humanos e a descontinuidade do incentivo financeiro aos pacientes foram os fatores destacados como determinantes para esta baixa proporção.

Os medicamentos para tratamento de tuberculose estão disponíveis nas policlínicas, porém o PMF não dispõe de uma reserva, o que pode ocasionar atraso no início do tratamento.

Em todas as unidades estudadas a taxa de cura foi menor que 85% e o abandono maior que 10%. A letalidade foi maior em uma das policlínicas e os casos sem informação dos resultados de tratamento mostrou-se maior que os demais em outra policlínica.

As visitas domiciliares realizadas pelos profissionais das policlínicas acontecem em situações especiais e pouco freqüentes. No PMF esta atividade é rotineira, faz parte das atividades de campo previstas no horário de trabalho daqueles profissionais.

A proporção de contatos registrado e examinados em ambas as policlínicas foi menor que quatro por paciente. No PMF não encontramos esse registro.

Todas as unidades fazem a notificação dos casos, que pode ser feita pelo médico ou pelo profissional da vigilância. Apesar de recomendado, a notificação nem sempre é feita no início do tratamento.

 

CONTEXTO DE EFEITOS

O município apresentou resultados de cura (82,8%) e abandono (7,0%) melhores que os das unidades estudadas. A letalidade, porém, mostrou-se menos favorável (7,7%). Ressalta-se que entre os que tiveram tratamento supervisionado as taxas de cura foram bem superiores (96%). Nas policlínicas somente 2,8% dos pacientes foram tratados de forma supervisionada.

Os usuários pronunciaram-se satisfeitos com o atendimento e orientações recebidas dos profissionais.

As equipes do PMF foram responsáveis pelo acompanhamento de 11,3% dos casos do município, enquanto que as duas policlínicas estudadas acumulavam pouco menos que 50% dos pacientes.

 

DISCUSSÃO

A pesquisa avaliativa considera os contextos em que o programa a ser avaliado se insere. Com relação ao contexto externo, que descreve a situação local, destacando os aspectos que podem facilitar ou dificultar a permanência da endemia, vimos que o município tem alta densidade demográfica e mais de 10% da população habitando aglomerados subnormais, locais com condições desfavoráveis de saneamento e onde a aglomeração favorece a disseminação de doenças. Por outro lado, o município tem aumentado o investimento de recursos financeiros aplicados na saúde, embora conte ainda com proporção pequena de unidades de saúde e leitos públicos para atendimento de sua população, quando comparados às proporções do estado e do país.

Embora tenha sido pioneiro na implantação da Estratégia de Saúde da Família, a cobertura atual do programa ainda é baixa. Além disso, constata-se que o PMF, apesar do longo tempo em que se mantém no município, não demonstra total sustentabilidade, devido ao seu caráter complementar e à sua ausência nos documentos de composição da FMS.

Com relação à escolaridade, percebe-se em Niterói uma proporção maior tanto de pessoas alfabetizadas como com mais anos de estudo, quando comparado ao estado e ao país. A população com 10 anos ou mais de idade representa 83,9% da população total. Destes, 49,2% estão ocupados. Embora o percentual da população com rendimento no país seja maior que a do estado e do município, a proporção da população com renda superior a 5 salários mínimos é maior em Niterói.

Quanto aos aspectos do saneamento, verifica-se que o estado tem proporções maiores que as do município e o país possui comparativamente as menores taxas.

O desenvolvimento do contexto externo foi considerado parcial, de acordo com os escores dados aos indicadores estabelecidos neste estudo.

Com relação à organização do serviço para o controle da tuberculose, encontramos uma integração não sistematizada entre PCT e ESF. Isso é confirmado pela falta de planejamento conjunto entre os dois programas, bem como ausência de avaliação compartilhada. É inegável que essas ações podem acontecer de forma esporádica e não sistematizada, por iniciativa dos profissionais que atuam no nível central, todos eles com qualificação e experiência.

A participação das coordenações na decisão sobre a proporção de recursos aplicados na saúde em geral, e para o controle da tuberculose em particular, é nula. Há participação nas decisões sobre a utilização dos recursos que são disponibilizados, uma vez que a gerência tem melhor visão sobre as necessidades da rede.

O PMF de Niterói tem sua gestão compartilhada entre a FMS e a Associação de moradores, o que possibilita a participação popular e o controle social sobre, entre outras coisas, a qualidade e horário do trabalho dos profissionais contratados. Por outro lado, conflitos têm sido relatados entre os profissionais e componentes das associações de moradores.

A supervisão do PCT é exercida por um único profissional para todo o município, o que dificulta o cumprimento do organograma proposto. Na ESF há uma equipe de supervisão para um grupo de módulos, com ações de supervisão e treinamento programadas semanalmente.

Há programa de capacitação para as equipes de saúde da família que acontece de forma contínua, com maior volume de treinamentos do que os oferecidos aos profissionais da rede tradicional. Apesar disso, pudemos verificar que alguns profissionais referem falta de experiência e insegurança ao lidar com pacientes com tuberculose.

O tratamento supervisionado como estratégia para evitar o abandono, apesar de valorizado pelos profissionais, é oferecido a pequena parcela dos usuários em tratamento e sofre processo de descontinuidade no fornecimento de incentivos financeiros, além de carência de recursos humanos e estrutura física na rede. A equipe da ESF tenta manter a supervisão do tratamento para todos os moradores de sua área acometidos pela doença. Porém, observamos que a falta de recursos humanos dificulta o procedimento, limitado na maior parte das vezes ao comparecimento do usuário à unidade. O mesmo acontece com relação à busca de casos. Apesar de terem consciência da necessidade de busca em áreas onde há pessoas em situação mais vulnerável, essa ação é freqüentemente adiada devido à carência de recursos humanos. Em todas as unidades as buscas de casos foram realizadas somente a partir de casos suspeitos comunicados, de maneira pontual.

Desta forma, a partir dos escores atribuídos aos indicadores do contexto político-organizacional, consideramos que sua implantação é parcial.

O acesso aos serviços de diagnóstico e tratamento de tuberculose não representam dificuldade no município, apesar de haver uma pequena variação quanto à recepção nos serviços. A existência de setor específico para este tipo de atendimento na policlínica, bem como componentes da equipe exclusivos do setor, parece favorecer a comunicação entre os profissionais e a concentração de material, documentos e atividades em um só local da unidade. O setor torna-se assim a referência onde se encontram as informações e onde profissionais e usuários buscam a resolução de problemas.

O módulo do PMF é certamente a unidade com melhor acesso aos usuários cadastrados, porém a gama de atividades que os profissionais têm que realizar pode gerar uma sobrecarga de trabalho, o que resulta no descarte de algumas ações.

No que diz respeito à estrutura física, a existência de setor específico para atendimento de tuberculose também mostrou uma situação favorável para a biossegurança. O módulo do PMF é o que apresenta piores condições nesse sentido. O mesmo acontece com relação ao tempo de espera para resultado da baciloscopia.

A proporção de doentes com tuberculose acompanhados nas duas policlínicas estudadas foi de 46,17% dos casos do município. Isso mostra a distribuição desigual dos casos entre as unidades, predominando em geral o atendimento por especialistas, o que corrobora os achados de Natal et al.12 quanto à cobertura insatisfatória dos serviços quando se verifica a distribuição dos casos por unidade. Essa concentração da demanda também dificulta a realização de outras atividades, como tratamento supervisionado, exame dos contatos e busca de casos.

Os resultados dos tratamentos das unidades estudadas tiveram proporções inferiores às metas estabelecidas pelo Ministério da Saúde.

As visitas domiciliares são rotineiras no PMF, programadas de acordo com necessidades que surgem, mas espera-se que cada domicílio cadastrado seja visitado ao menos uma vez ao ano. Vimos, porém, que algumas vezes a ida à comunidade é prejudicada pela necessidade de permanência dos profissionais no módulo. Nas policlínicas, as visitas domiciliares acontecem somente em situações muito especiais. Há carência de recursos humanos e materiais para esta atividade. O número de contatos examinados ficou abaixo do recomendado nas duas policlínicas. No PMF não encontramos registro, embora os profissionais relatassem que todos os contatos são examinados.

As notificações e repasse de informações para o nível central, bem como o preenchimento do livro de registro de dados, apresentaram variações entre as unidades estudadas. A implantação do programa foi considerada parcial em todas elas, com resultados ligeiramente melhores na policlínica B e no módulo do PMF.

Quanto aos resultados de tratamento, a ESF teve o desempenho alcançado, enquanto que as unidades de saúde tradicionais tiveram um alcance parcial. Há que se considerar que o número de casos tratados no PMF foi pequeno e que todos foram submetidos ao tratamento supervisionado, o que aumenta consideravelmente a taxa de cura e, consequentemente, diminui a de abandono e óbito. Outro fator interveniente foi o fato de não ter sido realizada entrevista com usuário no PMF.

Podemos concluir que a integração entre os diversos programas que fazem parte da Atenção Básica em Saúde, representada neste estudo pelas ações de controle de tuberculose e pela ESF, mostrou-se incipiente. Os principais pontos observados que impedem essa integração são a implantação e a consolidação do PMF em Niterói como um programa de caráter complementar, a carência de recursos humanos e a sobrecarga de trabalho, além do fato de a subordinação técnica e administrativa dos programas estarem localizadas em diferentes locais da estrutura organizacional. Natal12 considera que as prioridades e metas definidas pelos programas seriam, assim, diferentes, o que ocorreria também com o planejamento, a capacitação e o perfil de seus recursos humanos.

A integração inexpressiva no nível organizacional se reflete na relação entre as unidades de saúde tradicionais e as USF, não existindo entre seus profissionais um intercâmbio formal. As ações no nível local, na maior parte das vezes, são realizadas de forma isolada.

O grau de implantação do PCT nas policlínicas e na USF foi parcial e semelhante. Entretanto, a estrutura física e os recursos humanos diferiram entre as unidades, assim como a forma de recepção dos usuários.

As ações de busca de casos, busca de pacientes que abandonaram o tratamento e exame de contatos mostraram-se insuficientes e não integradas entre as unidades. O tratamento supervisionado, embora tenha sido citado como estratégia para prevenir o abandono do tratamento, foi realizado em número reduzido de pacientes. Ressalte-se que, nesta forma de administração do tratamento, os resultados foram muito mais favoráveis.

O modelo lógico de avaliação foi elaborado e mostrou ser suficiente para atingir os objetivos, e pode servir de suporte para a formulação de um modelo de auto-avaliação a ser utilizado pelos profissionais da rede.

 

REFERÊNCIAS

1. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Vigilância Epidemiológica – Tuberculose. http://www.saude.gov.br/svs (acessado em 2005).

2. World Health Organization. What is DOTS? A guide to understanding the WHO recommended TB Control Strategy known as DOTS. WHO/ CDS/CPC/TB/99.270, 1999.

3. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Programa Nacional de Controle da Tuberculose. Brasília: Ministério da Saúde, 2004.

4. SES / RJ. Boletim informativo 2005. Programa de Controle da Tuberculose do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: SES, 2005.

5. Mascarenhas MTM. Implementação da Atenção Básica em Saúde no Município de Niterói, RJ: Estudo de caso em Unidade Básica de Saúde Tradicional e Módulo do Programa Médico de Família [tese de doutorado]. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Saúde Pública, 2003.

6. Ministério da Saúde. Plano Nacional de Controle da Tuberculose/Fundação Nacional de Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 1999.

7. Yin RK. Estudo de caso: planejamento e métodos. 3a ed. Porto Alegre: Bookman; 2005.

8. Center for Disease Control. Framework for Program Evaluation in Public Health. Atlanta (US): MMWR; 1999.

9. Hartz ZMA,org. Avaliação em Saúde: dos modelos conceituais à prática na análise de implantação de programas. Rio de Janeiro: Fiocruz, 1997.

10. Lee T, Price M. Indicators and Research Methods for Rapid Assessment of a Tuberculosis Control Programme: case study of a rural area in South Africa. Tubercle and Lung Disease (1995) 76, : 441-449.

11. IBGE, Resultados da Amostra do Censo demográfico 2000. Rio de Janeiro: IBGE, 2004. In www.ibge.gov.br acessado em 20/03/2007.

12.Natal S et al. Avaliação do Programa de Controle da Tuberculose: estudo de casos na Amazônia Lega. Boletim de Pneumologia Sanitária, v.12, 2004. :91-109

 

 

Endereço:
Luisa Gonçalves Dutra de Oliveira.
Rua Lopes Trovão, 134/1801 Bl 2
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