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Revista Pan-Amazônica de Saúde

versão impressa ISSN 2176-6215versão On-line ISSN 2176-6223

Rev Pan-Amaz Saude v.1 n.3 Ananindeua set. 2010

http://dx.doi.org/10.5123/S2176-62232010000300013 

ARTIGO ORIGINAL | ORIGINAL ARTICLES | ARTÍCULO ORIGINAL

 

Indicadores epidemiológicos da leishmaniose tegumentar americana, no período de 1999 a 2008, no Estado de Alagoas, Brasil

 

Epidemiological indicators of cutaneous leishmaniasis in Alagoas State, Brazil, from 1999 to 2008

 

Indicadores epidemiológicos de la leishmaniasis tegumentar americana, en el período de 1999 a 2008, en el Estado de Alagoas, Brasil

 

 

Bruno Gomes PadilhaI; Paulo Victor Vasconcelos de AlbuquerqueI; Fernando de Araújo PedrosaII

IFaculdade de Medicina, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, Alagoas, Brasil
IIInstituto de Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, Alagoas, Brasil

Endereço para correspondência
Correspondence
Dirección para correspondencia

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: A leishmaniose tegumentar americana faz parte do grupo de doenças parasitárias que acometem pele e mucosas, e é intimamente relacionada a alterações ambientais, comportamentais humanas e demográficas, sendo um grave problema de saúde pública no Brasil, comprovadamente em Alagoas.
MÉTODOS: Foram calculados e avaliados os indicadores epidemiológicos do manual de leishmaniose tegumentar americana do Ministério da Saúde. Optou-se por uma série histórica de dez anos, com dados coletados no Departamento de Vigilância Epidemiológica da Secretária Estadual de Saúde de Alagoas.
RESULTADOS: Constatou-se a notificação de 1.338 novos casos autóctones, dos quais 1.097 pacientes tinham idade igual ou maior que 10 anos. Quanto ao sexo, 525 pacientes eram do sexo feminino e 811 do sexo masculino. A forma cutânea foi diagnosticada em 969 pacientes, com pico em 2007, quando foram registrados 98,3% dos casos. Realizaram-se 625 intradermorreações de Montenegro, obtendo, no ano de 2008, um valor máximo de 99,1%.
CONCLUSÃO: Observou-se em Alagoas um coeficiente de detecção de nível médio, com predomínio de homens maiores de 10 anos de idade e com a forma cutânea, apresentando uma tendência de diminuição no número de casos e aumento da proporção no sexo masculino na faixa de idade maior ou igual a 10 anos e nas lesões cutâneas. O conhecimento desse panorama auxilia as tomadas de decisões em saúde pública no Estado.

Palavras-chave: Leishmaniose Mucocutânea; Indicadores; Vigilância Epidemiológica.


ABSTRACT

INTRODUCTION: Cutaneous leishmaniasis is a severe public health problem in Brazil, particularly in Alagoas State. It is one of the parasitic diseases that affect skin and mucosae, and is closely related to environmental, behavioral and demographic changes.
METHODS: The epidemiological indicators of the manual for surveillance of American integumentary leishmaniasis were calculated and evaluated on a ten-year historical series and their data were collected by the Department of Epidemiological Surveillance of the Alagoas State Secretary of Health.
RESULTS: A total of 1,338 new indigenous cases were notified: 1,097 patients were 10 years old or older; 525 patients were female and 811 male. Cutaneous leishmaniasis was diagnosed in 969 patients, with a peak in 2007, when 98.3% of the cases were reported; 625 Montenegro skin tests were performed, with a peak of 99.1% in 2008.
CONCLUSIONS: In Alagoas, a medium level detection rate was observed, with a prevalence of the cutaneous type in male patients over 10 years old, and a decreasing trend in the case numbers and an increase in the proportion of males in the age group of ≥ 10 years old and in the cutaneous lesions. Knowing this panorama supports decision making processes in the public health field within the state.

Keywords: Leishmaniasis, Mucocutaneous; Indicators; Epidemiologic Surveillance.


RESUMEN

INTRODUCCIÓN: La leishmaniasis tegumentar americana es parte del grupo de enfermedades parasitarias que acometen la piel y las mucosas, y está íntimamente relacionada a alteraciones ambientales, comportamentales humanas y demográficas, siendo un grave problema de salud pública en Brasil, comprobadamente en Alagoas.
MÉTODOS: Fueron calculados y evaluados los indicadores epidemiológicos del manual de leishmaniasis tegumentar americana del Ministerio de Salud. Se optó por una serie histórica de diez años, con datos recolectados en el Departamento de Vigilancia Epidemiológica de la Secretaría Estadual de Salud de Alagoas.
RESULTADOS: Fue constatada la notificación de 1.338 nuevos casos autóctonos, de los cuales 1.097 pacientes tenían edad igual o superior a 10 años. Con relación a sexo, 525 pacientes eran del sexo femenino y 811 del sexo masculino. La forma cutánea fue diagnosticada en 969 pacientes, con un pico en 2007, cuando se registró un 98,3% de los casos. Fueron realizadas 625 intradermo reacciones de Montenegro, obteniendo, el año de 2008, un valor máximo de 99,1%.
CONCLUSIÓN: Se observó en Alagoas un coeficiente de detección de nivel medio, con predominio de hombres mayores de 10 años de edad y de la forma cutánea, presentando una tendencia de disminución en el número de casos y aumento de la proporción del sexo masculino en la franja de edad mayor o igual a 10 años y en las lesiones cutáneas. El conocimiento de ese panorama auxilia en la tomada de decisión en salud pública en el Estado.

Palabras clave: Leishmaniasis Mucocutánea; Indicadores; Vigilancia Epidemiológica.


 

 

INTRODUÇÃO

A leishmaniose tegumentar americana (LTA) faz parte do grupo de doenças parasitárias que acometem pele e mucosas. O protozoário responsável pelo quadro clínico pertence ao gênero Leishmania, tratando-se de um parasito intracelular obrigatório de macrófagos1. Trata-se de uma zoonose com ampla distribuição geográfica e com manifestações clínicas que podem evoluir para lesões que mutilam o paciente. Além deste aspecto, a LTA está intimamente relacionada às alterações ambientais, comportamentais humanas e demográficas, estando em evidência como um grave problema de saúde pública no Brasil2,3.

É uma doença que vem sendo notificada em todos os Estados brasileiros4, atingindo indivíduos de diferentes faixas etárias e em ambos os sexos5,6,7. O Brasil, juntamente com outros cinco países, detém 90% dos casos de leishmaniose cutânea do mundo8,9. A Região Nordeste responde por 39% dos casos notificados de LTA do Brasil10.

A provável espécie responsável pela transmissão de LTA em Alagoas é a L. (V.) braziliensis, a qual está presente em todos os Estados do País11 e é a de mais vasta distribuição geográfica entre os agentes causadores de LTA no mundo12.

O estudo dos indicadores epidemiológicos e operacionais da LTA em Alagoas numa série histórica de dez anos permite avaliar a dinâmica da endemia e planejar medidas de controle, visando diminuir seu impacto sobre a população, auxiliando na tomada de decisão em saúde pública9 nas esferas da vigilância, da assistência e controle. Os resultados obtidos neste estudo poderão ser expandidos para os Estados vizinhos, onde as condições epidemiológicas são semelhantes às de Alagoas.

Foram analisados os dados referentes aos coeficientes de detecção, das faixas etárias, do sexo, das manifestações (formas) clínicas, da densidade, dos métodos de auxílio diagnóstico e da proporção de cura clínica11.

 

MÉTODOS

Trata-se de um estudo que calcula e avalia os indicadores epidemiológicos contidos no manual de leishmaniose tegumentar americana do Ministério da Saúde (MS). Optou-se por um período de dez anos (janeiro de 1999 - dezembro de 2008) no Estado de Alagoas, abrangendo todas as notificações de novos casos realizadas nessa década, em todos os 102 municípios do Estado.

Os dados foram coletados no Departamento de Vigilância Epidemiológica da Secretária Estadual de Saúde de Alagoas, pelo Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN). A partir dos dados obtidos foram calculados os indicadores.

O Manual apresenta 11 pontos a serem analisados. São eles: número de novos casos autóctones notificados na unidade federada no ano; coeficiente geral de detecção de casos na unidade federada por 100 mil habitantes; proporção anual de casos na faixa etária menor de 10 anos entre o total de casos diagnosticados no ano; proporção anual de casos na faixa etária de 10 anos ou mais entre o total de casos diagnosticados no ano; proporção anual de casos no sexo feminino entre o total de casos diagnosticados no ano; proporção anual de casos no sexo masculino entre o total de casos diagnosticados no ano; proporção de casos da forma mucosa entre o total de casos diagnosticados; proporção de casos da forma cutânea entre o total de casos diagnosticados no ano; densidade de casos; proporção de casos novos submetidos a métodos auxiliares de diagnóstico, entre o total de casos diagnosticados no ano; proporção de casos que evoluíram para cura clínica entre o total de casos registrados do período11.

Para o coeficiente geral de detecção foram utilizadas as estimativas populacionais do banco de dados do Sistema Único de Saúde (DATASUS) de 1999 a 2008.

Foram realizadas distribuições de frequências, regressões lineares, cálculo das médias, desvios padrões e percentuais dos dados, para a análise estatística do estudo.

 

RESULTADOS

No período de 1999 a 2008, em Alagoas, foram notificados 1.338 casos de LTA, apresentando um coeficiente de detecção que variou de 1,5 a 11,0 por 100 mil habitantes, segundo dados da Secretaria Estadual de Saúde de Alagoas. A densidade de casos de LTA, o coeficiente geral de detecção de casos e o número de novos casos autóctones são observados na tabela 1. Inicia-se em ascensão, atingindo o valor máximo no ano de 2000, para todas as variáveis. Logo após, seguem-se períodos alternando elevação e decréscimo até atingirem o valor mínimo para as três variáveis no ano de 2006, seguindo-se leve ascensão e, de novo, decréscimo nas três variáveis.

 

 

Na figura 1 são abordadas as variáveis de proporção anual de LTA em pessoas com idade menor que 10 anos e em pessoas com idade igual ou maior que 10 anos; e proporção anual de LTA no sexo feminino e no sexo masculino. Observa-se que, num total de 241 pacientes menores de 10 anos de idade, houve variações para mais ou para menos nas ocorrências, mas sempre situadas entre 21,73% no ano de 1999 e 11,56% no ano de 2002, valores máximo e mínino, respectivamente (Figura 1). Também no total de 1.097 pacientes com idade igual ou maior que 10 anos, ocorrem variações para mais ou para menos nos valores compreendidos entre 88,42% no ano de 2002 — valor máximo — e 78,26% no ano de 1999 — valor mínimo. Nas proporções referentes ao sexo trabalhou-se com 525 pacientes do sexo feminino e 811 do sexo masculino. Em ambos os sexos houve alternância de períodos de aumento na proporção com períodos de declínio. Para o sexo feminino, os valores máximo e mínimo foram, respectivamente, 47,82%, no ano de 1999, e 28,44% no ano de 2008; e para o sexo masculino, os valores máximo e mínimo foram 71,55%, em 2008, e 51,73%, em 1999.

 

 

A figura 2 retrata a proporção de casos novos diagnosticados de LTA na forma cutânea e na forma mucosa, e a proporção de casos que evoluíram para a cura clínica. Todas apresentaram variações de elevação e decréscimo, como retratado na figura. A forma mucosa foi diagnosticada em 70 pacientes com valor máximo no ano de 2006, correspondendo a 17% dos casos, e valor mínimo em 2007, com 1,62% dos casos. Na forma cutânea — foram 969 pacientes — o pico máximo ocorreu no ano de 2007, com 98,3% dos casos e o pico mínimo em 1999, com 51,7% dos casos. A alta por cura clínica apresentou pico máximo em 2008 e mínimo em 2001.

 

 

Na figura 3 são mostradas as proporções de casos novos submetidos a métodos auxiliares de diagnóstico entre o total de diagnosticados no ano. Esses métodos são: a intradermorreação de Montenegro (IDRM) e os exames histopatológico e parasitológico direto. A IDRM foi realizada em 625 pacientes, e apresentou tendência geral de ascensão, como pode ser visto na figura onde se registram apenas dois pontos de variação para menor, os anos de 2000 e 2004, o primeiro sendo o pico mínimo, correspondendo a 16,4% dos casos. O pico máximo foi observado no ano de 2008, com uma cobertura de 99,1% dos casos. O exame histopatológico foi realizado em 225 casos, sendo seu valor máximo, 56,84%, no ano de 2002, e seu valor mínimo no ano de 2000, 7,71%, com os demais valores situados nesta faixa. Já o exame parasitológico direto também apresenta oscilações, tendo o valor máximo, 44,55% ocorrido no ano de 2006, e o valor mínimo, 7,4%, no ano de 2000, com um total de 205 realizações.

 

 

Por meio das regressões lineares (Figura 4) é possível observar que o número de casos notificados apresenta uma tendência à diminuição, contudo ocorre uma predominância crescente no sexo masculino, nos pacientes com idade maior ou igual a 10 anos e na forma cutânea da doença em relação à forma mucosa.

 

 

 

DISCUSSÃO

No Estado de Alagoas, o coeficiente de detecção de LTA mostrou-se, ao longo da década analisada, predominantemente no segundo quartil. Esse parâmetro de classificação enquadra Alagoas em nível médio no que se refere a esse indicador11. Ao longo de 10 anos o coeficiente médio de detecção de LTA firmou-se em 4,6 casos por 100 mil habitantes. Comparando o coeficiente de detecção deste trabalho, encontrou-se uma divergência com os valores do SINAN, divulgados pelo MS, onde a média foi de 3,6/100 mil habitantes. Em relação à Região Nordeste (17,2), Alagoas situa-se na quinta posição, estando com os maiores coeficientes os Estados do Maranhão (58,2), Ceará (22,1), Bahia (17,8) e Pernambuco (7,4). Valores inferiores foram encontrados nos Estados do Piauí (4,5), Paraíba (2,0) e Rio Grande do Norte (0,3). No Brasil, a média do coeficiente de detecção do período estudado foi 15,7.

Esse valor caracteriza o Estado como área endêmica para LTA, porém mostrando uma tendência de diminuição do número de casos13. Por se tratar de uma doença multifatorial, vários aspectos, isoladamente ou associados, tais como: redução da população rural, consolidação das áreas desmatadas, o uso de inseticidas em algumas áreas, dentre outros, podem ter contribuído com essa redução. Outros fatores (ambientais e ecológicos) podem ter influenciado no decréscimo do número de casos, uma vez que a variação anual tem ocorrido em outros Estados.

A prevalência de casos no sexo masculino obteve média de 61,3% em uma década, porém inferior à média nacional, que se situa acima dos 70%. Considerando que o Estado de Alagoas sofreu forte impacto de desmatamento, em decorrência da expansão da cultura da cana-de-açúcar, o componente florestal pode estar contribuindo menos na prevalência masculina da doença.

No que se refere à faixa etária mais elevada ocorreram oscilações entre 78,3% no ano de 1999 até 88,4% em 2002, o que corrobora a informação que homens adolescentes e adultos são os mais acometidos, geralmente trabalhadores de áreas rurais e maiores de 10 anos de idade, em idade reprodutiva e laborativa14,15, relacionados principalmente com plantações de subsistência, principalmente de bananeira, em áreas de desmatamento antigo16,17.

Observa-se que há uma tendência na elevação da prevalência em idade maior ou igual a 10 anos e no sexo masculino, uma vez que homens adolescentes e adultos desenvolvem atividades laborais mais afastados do domicílio do que as crianças e as mulheres.

A ocorrência de casos em mulheres, crianças, adolescentes e idosos sugere evidência de transmissão peridomiciliar18,19, devido à localização das residências próximas dos bananeirais ou matas remanescentes, como também pela possibilidade de adaptação de vetores16,17,12. Entretanto, parece não haver variação durante o período estudado. Apesar de Ampuero et al20, terem referido a possibilidade da presença de um adulto infectado como hospedeiro intradomiciliar da Leishmania, historicamente não tem sido essa a forma de manutenção do ciclo de transmissão de LTA no País. De uma maneira geral, a transmissão é vetorial e em áreas de colonização antiga, em que os animais domésticos podem servir como fonte de atração aos vetores. Mas mesmo nestas áreas não é fácil mostrar que existe domiciliação dos vetores da LTA, muito menos o homem servindo como disseminador da doença. Em geral os homens são alcançados pelo raio de dispersão dos vetores, que vêm atraídos pela luz, presença de animais domésticos e eventualmente do próprio homem.

O aparecimento de lesão em mucosas mantém-se sempre abaixo dos 10%, com uma média, em 10 anos, de 6,8% dos casos, exceto no ano de 2006, quando atingiu a marca de 17%. Esse dado coincide com outros estudos, quanto à frequência de lesões em mucosa de pacientes com LTA10,7. A prevalência da forma mucosa detectada em Alagoas é semelhante à da média nacional nos anos de 2001 a 2006, que foi de 6,3%. No ano de 2006 houve um acréscimo na detecção de pacientes com lesão mucosa (17%); isso pode ter ocorrido em decorrência de uma maior atividade do programa estadual de endemias nesse ano, tendo como consequência o crescimento do conhecimento sobre a doença, como também do diagnóstico e tratamento precoces21. As lesões mucosas aparecem geralmente após um período de cinco anos do surgimento da lesão primária1 e são favorecidas também em pessoas desnutridas7.

O acometimento de mucosas está relacionado provavelmente a infecção pela L. (V.) braziliensis22,15,23, o que reforça a possibilidade desta espécie ser a principal responsável pela LTA em Alagoas. Essa forma está associada à persistência do parasito nos tecidos com posterior migração pela corrente sanguínea como também pela via linfática24. Apesar de não existirem estudos em Alagoas identificando a espécie responsável pela LTA, segundo Reis et al3, no Estado de Pernambuco, que faz parte do mesmo circuito de transmissão de Alagoas, a L. (V.) braziliensis foi o único parasito encontrado.

Com a forma cutânea, a expressão da doença dá-se tanto por meio de lesões, única ou múltiplas, e representa a forma mais frequente da doença8,25. No presente estudo notou-se que desde 2002 - exceto em 2006 - a notificação da forma cutânea esteve acima de 90%7,23. Logo, a importância do tratamento da lesão cutânea tem como objetivo: impedir a invasão pelo parasito da mucosa, acelerar o processo de cicatrização e evitar a formação de cicatrizes desfigurantes26.

Percebe-se que no período de dez anos as altas clínicas aumentaram, principalmente no período de 2003 a 2008, sendo observado, no último ano, um índice de 91,7% de pacientes curados e que receberam alta médica. O critério de cura do paciente é clínico, sendo recomendado monitoramento mensal nos três primeiros meses e, com a cura clínica alcançada, o acompanhamento deve seguir por até um ano após o final do tratamento27,11. Esse crescimento está associado ao acompanhamento clínico, ao uso da medicação e rapidez do início do tratamento21. Isso leva o paciente a aderir ao tratamento com maior facilidade, apesar dos efeitos colaterais apresentados pela medicação em alguns pacientes, como também reduz a velocidade de ulceração da lesão e previne a disseminação do parasito9. Outro aspecto relacionado ao aumento do percentual de encerramento dos casos por cura é o reflexo de uma melhora no seguimento dos pacientes, consequentemente, na informação contida no SINAN, já que o número de óbitos (9) e de abandono (17) foi muito baixo.

O diagnóstico da LTA é eminentemente clínico, pela presença da úlcera com bordas elevadas e enduradas (borda em moldura), presença de granulações grosseiras em fundo da lesão, associados a dados epidemiológicos27. É confirmado por meio de IDRM e exames parasitológico direto e histopatológico da lesão. Esses exames são os recomendados pelo MS para aplicação do critério laboratorial.

O IDRM avalia a resposta de hipersensibilidade celular retardada28 e apresenta sensibilidade em torno de 90%3, porém a especificidade é baixa devido à ocorrência de reações cruzadas29. Percebe-se que no último ano estudado a utilização do IDRM atingiu uma média de 99,1% dos indicadores, demonstrando a sua importância na complementação do diagnóstico. Apesar da baixa especificidade, Faber et al30, defendem sua utilização associada a critérios clínicos e recomenda sua aplicação para o início da terapêutica.

A visualização do parasito corado com Giemsa ao microscópio - exame parasitológico direto - confirma a LTA. Além de apresentar um baixo custo, é de simples e rápida execução31. Segundo o MS é o exame de primeira escolha para o diagnóstico de LTA11. Mas observou-se que, em 10 anos, sua utilização foi pouco efetuada, somente apresentando alguns picos nos anos de 2003 (33%), 2005 (29,7%) e 2006 (42,6%). Essa técnica tem sido pouco utilizada em Alagoas pela falta de profissionais capacitados na identificação dos amastigotas. Conforme Schwartz et al26, em um trabalho de revisão encontrou-se de 19-77% de sensibilidade para o método. Vega-Lopéz29, em artigo de opinião, fez referência à sensibilidade de 50-70%. Andrade et al32, em Pernambuco, para L. braziliensis, obteve-se uma sensibilidade de 47,9%. Como a provável espécie responsável pela LTA é a L. braziliensis, esta técnica é de baixa sensibilidade contribuindo para isso o fato de que muitos pacientes apresentam lesões antigas, além do que este exame depende do tamanho da amostra retirada33 e da quantidade de parasitos na lesão.

O emprego das biópsias de lesão foi bastante parecido com o registrado nas pesquisas diretas do parasito, como se observa na figura 3. A única diferença significativa ocorreu no ano de 2002 (56,8%) com um aumento da média, devido a uma pesquisa realizada para uma tese de doutorado utilizando a técnica de imunohistoquímica. Esse método diagnóstico só é conclusivo quando detectada a presença dos amastigotas ou as características histológicas são compatíveis com LTA, senão conclui-se como sugestivo para LTA33. Nele se observa a presença do granuloma epitelióde com infiltrado histio-plasmocitário e presença de parasitos, por vezes34. O estudo histopatológico das lesões é utilizado para aprofundar o diagnóstico da LTA ou quando se necessita de dados para estudos de perfis epidemiológicos, pois a detecção do parasito varia em torno de 20% a 25%35 determinando uma baixa sensibilidade. Além disso, existe a dificuldade na obtenção do exame, visto que este demanda uma análise em centros com experiência no diagnóstico de LTA32.

 

CONCLUSÃO

Alagoas apresenta um coeficiente de detecção de nível médio (4,6 casos por 100 mil habitantes), de acordo com os padrões estabelecidos pelo manual de leishmaniose tegumentar americana do MS. Esses dados evidenciaram a predominância de casos no sexo masculino, de idade maior de 10 anos e com a forma cutânea, refletindo no Estado o padrão nacional da doença.

Esse panorama exibe uma tendência de diminuição no número de casos ao longo dos anos do estudo, todavia mostra um aumento na proporção do sexo masculino na idade maior ou igual a10 anos e nas lesões cutâneas.

O presente estudo permitiu o conhecimento dos principais indicadores epidemiológicos propostos pelo MS e que raramente são calculados pelas vigilâncias epidemiológicas. A construção das figuras de tendência, a partir da regressão linear, permite que os gestores possam prever a dinâmica da endemia para a tomada de decisões. Outros estudos poderão ser realizados, utilizando da mesma metodologia, tomando os Municípios ou as localidades como base de cálculo para melhor entender os aspectos focais da doença.

 

AGRADECIMENTOS

Ao Departamento de Vigilância Epidemiológica da Secretária Estadual de Saúde, na pessoa do coordenador, sr. Luiz Tadeu Silva Lessa.

 

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Bruno Gomes Padilha
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Recebido em / Received / Recibido en: 16/9/2010
Aceito em / Accepted / Aceito en: 28/9/2010