SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.4 número3Espécies de Culicoides (Diptera; Ceratopogonidae) e hospedeiros potenciais em área de ecoturismo do Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses, BrasilBusca por Hepacivirus semelhante ao vírus da hepatite C, em primatas não humanos índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

  • Não possue artigos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Pan-Amazônica de Saúde

versão impressa ISSN 2176-6215versão On-line ISSN 2176-6223

Rev Pan-Amaz Saude v.4 n.3 Ananindeua set. 2013

http://dx.doi.org/10.5123/S2176-62232013000300003 

ARTIGO ORIGINAL | ORIGINAL ARTICLE | ARTÍCULO ORIGINAL

 

Infecções da corrente sanguínea por Candida spp. em unidade neonatal de hospital de ensino da Região Norte do Brasil: estudo dos fatores de risco

 

Bloodstream infection by Candida spp. in the neonatal unit of a teaching hospital from North Region, Brazil: study of risk factors

 

Infecciones de la corriente sanguínea por Candida spp. en una unidad neonatal de hospital escuela de la Region Norte de Brasil: estudio de los factores de riesgo

 

 

Luís Paulo de Miranda Araújo Soares ; Rafael Trindade de Oliveira; Irna Carla do Rosário Souza Carneiro

 Universidade do Estado do Pará, Belém, Pará, Brasil

Endereço para correspondência
Correspondence
Dirección para correspondencia

 

 


RESUMO

As candidemias, responsáveis por elevada morbimortalidade, são cada vez mais causa de sepse em unidades de terapia intensiva neonatal. O objetivo do presente trabalho foi avaliar os fatores de risco relacionados com infecções da corrente sanguínea por Candida spp. em neonatos internados na unidade neonatal de um hospital de ensino da Região Norte do Brasil. O estudo foi do tipo caso-controle, retrospectivo, a partir de prontuários de pacientes admitidos de 2008 a 2010, nas unidades de cuidados intermediários e nas de terapia intensiva do setor de neonatologia do hospital da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará. Foram considerados casos de candidemia quando a hemocultura foi positiva para Candida spp. após 48 h de internação. A proporção entre casos e controles foi de 1:2. O estudo revelou 36 pacientes com candidemia, correspondendo ao coeficiente de 15,1 episódios por mil admissões. A infecção esteve associada ao extremo baixo peso, ao uso de cateter venoso central, à nutrição parenteral prolongada e à antibioticoterapia prévia pelo menos com três antibióticos.

Palavras-chave: Candidemia; Neonatologia; Fatores de Risco.


ABSTRACT

Candidemia has been responsible for high morbidity and mortality rates and is increasingly causing sepsis in neonatal intensive care units. The purpose of this study was to evaluate risk factors relating to Candida spp. bloodstream infections among neonates in the neonatal unit of a teaching hospital from Brazilian North Region. It was a retrospective and case-control study involving patient records admitted from 2008 to 2010 to the intermediary and intensive care units in the neonatology division of Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará hospital. Candidemia cases were confirmed when Candida spp. were detected from positive blood culture 48 h after admission. The proportion among cases and controls was 1:2, showing 36 patients with candidemia which is a coefficient of 15.1 episodes per 1,000 admissions. The infection was associated with extremely low birth weight, central venous catheter use, prolonged parenteral nutrition, and previous antibiotic therapy with at least three antibiotics.

Keywords: Candidemia; Neonatology; Risk Factors.


RESUMEN

Las candidemias, responsables por elevada morbilidad y mortalidad, son cada vez más causa de sepsis en unidades de terapia intensiva neonatal. El ob¡etivo del presente traba¡o fue el de evaluar los factores de riesgo relacionados a infecciones de la corriente sanguínea por Candida spp. en neonatos internados en la unidad neonatal del hospital escuela de la Región Norte de Brasil. El estudio fue del tipo caso-control, retrospectivo, a partir de prontuarios de pacientes admitidos de 2008 a 2010, en las unidades de cuidados intermedios y en las de terapia intensiva del sector de neonatología del hospital de la Fundación Santa Casa de Misericordia de Pará. Se consideraron casos de candidemia cuando el hemocultivo fue positivo para Candida spp. luego de 48 h de internación. La proporción entre casos y controles fue de 1:2. El estudio reveló 36 pacientes con candidemia, correspondiendo a un coeficiente de 15,1 episodios por 1.000 ingresos. La infección estuvo asociada a extremo bajo peso, uso de catéter venoso central, nutrición parenteral prolongada y antibioticoterapia previa con, al menos, tres antibióticos.

Palabras clave: Candidemia; Neonatología; Factores de Riesgo.


 

 

INTRODUÇÃO

As infecções de corrente sanguínea (ICS) por Candida spp. estão associadas a taxas elevadas de morbimortalidade em unidades de terapia intensiva neonatais (UTIN), sendo responsáveis por alterações do neurodesenvolvimento em até 70% dos recém-nascidos com extremo baixo peso1.

A maioria dos episódios de fungemia neonatal são causados por Candida albicans. Na última década, porém, estudos, incluindo nacionais, têm documentado colonização em até 50% dos casos por espécies de Candida não-C. albicans, como a Candida tropicalis, Candida parapsilosis — a ocorrência desta espécie geralmente associada à manipulação de cateteres vasculares centrais — e Candida glabrata2.

No período neonatal, a fungemia é complicação grave, principalmente entre recém-nascidos de muito baixo peso que, durante internação em UTIN, são expostos a situações que levam à ruptura das barreiras de defesa constituídas por pele e mucosas3.

A colonização e a infecção por espécies de Candida na população de neonatos são favorecidas por características inerentes ao hospedeiro com prematuridade e estrutura imatura das barreiras mucosas e de pele, bem como por fatores externos advindos do manejo em UTIN. Dentre estes, destacam-se o tempo de internação, a exposição prolongada à terapia antimicrobiana, os dispositivos invasivos como cateter venoso central (CVC) e ventilação pulmonar mecânica (VPM), a nutrição parenteral prolongada (NPP), o uso de corticosteroides e a densidade de colonização fúngica prévia em sítios do hospedeiro1,4.

O melhor conhecimento dos fatores de risco associados a esse tipo de infecção possibilita o desenvolvimento de estratégias para prevenir sua ocorrência3.

Considerando a importância das infecções fúngicas em neonatos e o grande número de pacientes internados no hospital da Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará (FSCMPA), o presente estudo teve como objetivo determinar a incidência das candidemias em neonatos, sua etiologia, bem como os fatores de risco associados à fungemia.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

ASPECTOS ÉTICOS

O presente estudo foi iniciado após aprovação do projeto de pesquisa pelo Núcleo de Pesquisa e Extensão em Medicina (NUPEM) da Universidade do Estado do Pará e pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da FSCMPA, em protocolo de número 044/10-CEP com data de aprovação no dia 26 de maio de 2010.

DESENHO DO ESTUDO

O estudo foi caracterizado como observacional, retrospectivo do tipo caso-controle, sendo realizado com dados referentes aos anos de 2008 a 2010.

CASUÍSTICA

A população foi formada por 108 pacientes admitidos na unidade neonatal da FSCMPA: 36 pertencentes ao grupo dos casos de candidemia neonatal e 72 ao grupo-controle.

Foram considerados como de candidemia os casos de pacientes que tiveram o diagnóstico confirmado por hemocultura após 48 h de admissão hospitalar, conforme a definição de infecção relacionada à assistência à saúde tardia de origem hospitalar do Ministério da Saúde5.

Foram considerados como controle os pacientes admitidos no setor de neonatologia que não apresentaram diagnóstico de candidemia confirmado por hemocultura. Para obter uma amostra comparável, os controles foram emparelhados para as variáveis: ala de internação (UTIN ou unidade de cuidados intermediários — UCI); período de internação (mês e ano); e tempo de internação mínimo, que deveria ser semelhante ao intervalo de tempo entre a internação e a ocorrência de candidemia do caso pareado. Dentre os pacientes que preencheram esse critério, foram sorteados dois controles para cada caso.

Os testes de identificação e de antibiograma foram realizados pelo laboratório de microbiologia do próprio hospital, aplicando a metodologia automatizada Vitek-2 (Vitek Systens Inc., Hazelwood, Mo, EUA).

PROTOCOLO DE PESQUISA

O protocolo de pesquisa aprovado pelo Comitê de Ética da FSCMPA foi elaborado especificamente para o estudo, com base nas fichas de notificação de infecção hospitalar da neonatologia, do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar da FSCMPA.

As informações dos protocolos de pesquisa, identificados aleatoriamente por meio de numeração, foram utilizadas somente para a presente pesquisa. As variáveis foram analisadas em conjunto com as de outros pacientes, não sendo divulgada qualquer informação que pudesse levar à sua identificação.

VARIÁVEIS ESTUDADAS

Foram coletados os seguintes dados de cada recém-nascido: sexo, peso ao nascer, idade gestacional (IG), ala de internação (UTIN ou UCI), intervalo de tempo entre a internação e o diagnóstico de candidemia, tempo de internação, intervenção cirúrgica e evolução (alta ou óbito).

Para definir a ala de internação, o paciente deveria estar internado na UTIN ou UCI no mínimo por 48 h anteriores à data da coleta da hemocultura.

Para a análise dos fatores de risco, foram consideradas as seguintes variáveis: peso ao nascer, IG, uso de CVC, VPM e NPP cirurgia prévia e uso prévio de antimicrobiano.

O uso de CVC foi considerado fator de risco quando estava presente no momento do diagnóstico da infecção ou até 48 h após a sua remoção, conforme o proposto pelo Ministério da Saúde5. O mesmo critério foi utilizado para VPM, NPP e cirurgia prévia.

ANÁLISE ESTATÍSTICA

O coeficiente de incidência foi calculado pelo número de episódios de candidemia a cada mil admissões. O estudo comparativo foi realizado por meio de análise de proporções, comparação de proporções e razões de chance (odds ratio) com intervalo de confiança de 95%. Todos os testes foram executados no software estatístico BioEstat 5.0, considerando um nível de rejeição da hipótese de nulidade de 5% (valor de p ≤ 0,05).

 

RESULTADOS

No período, foram estudados 36 casos de candidemia neonatal, dos quais 31 ocorreram em UTIN e cinco em UCI, com coeficientes de incidência de 15,1 e 0,9 casos a cada mil admissões, respectivamente. A distribuição anual dos coeficientes de incidência pode ser observada na figura 1. Dentre os pacientes, 61,1% eram do sexo masculino, 80,6% prematuros e 58,3% nasceram com muito baixo peso. O intervalo de tempo entre a internação e o diagnóstico laboratorial de candidemia foi, em média, de 17 dias (desvio padrão = ±11) e o tempo médio de internação de 56 dias (desvio padrão = ±32). A metade dos casos evoluiu a óbito.

 

 

C. albicans (27,8%), C. parapsilosis (25%), C. famata (22,2%), C. glabrata (2,8%) e Candida spp. (22,25) foram as espécies identificadas.

Os fatores de risco associados à ocorrência de candidemia estão dispostos na tabela 1.

 

 

DISCUSSÃO

A distribuição anual de casos de candidemia revelou um pico de incidência em 2009. Até 2007, os testes utilizados pelo laboratório do hospital tinham sensibilidade muito baixa para a identificação de Candida spp. Devido à importância da identificação deste patógeno, no ano de 2008 as hemoculturas passaram a ser realizadas em laboratório externo, por método automatizado. No entanto, a terceirização do serviço inviabilizava a coleta do material para hemocultura logo após a suspeita clínica. Desse modo, muitas vezes a terapia empírica era iniciada antes da coleta do sangue, diminuindo a sensibilidade do exame. Em 2009, o método automatizado para hemocultura foi introduzido no hospital, o que explica o aumento do registro da incidência da infecção nesse ano.

Devido à alta letalidade (50%) relacionada à candidemia neonatal, a partir de 2010 a equipe da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar passou a promover palestras com o objetivo de diminuir os fatores de risco relacionados à infecção e de preparar os profissionais para estabelecer diagnóstico precoce de candidemia, o que resultou no declínio de sua incidência.

Kossoff et al6, em 2008, referiram aumento nas ocorrências de candidemia nas últimas décadas, atribuindo como principal fator determinante os avanços nos cuidados prestados aos neonatos prematuros.

Os diversos procedimentos de rotina em UTIN, como uso de cateter, intubação e NPP, associados ao tempo prolongado de internação, aumentam o risco para a infecção7.

Na presente investigação, a incidência de candidemia em UTIN nos três anos foi relativamente elevada, quando comparada a outras alas do berçário, mas concordantes com os dados de uma unidade de referência, nos Estados Unidos (12,3/1.000 admissões)8. No entanto, pesquisas em hospitais de ensino na Argentina e no Kuwait revelaram maiores coeficientes de candidemia: 45,8 e 37,8 casos por mil admissões, respectivamente9,10. A população estudada era constituída de prematuros (80,6%) e de pacientes com baixo peso (58,3%), condições de risco para adquirir candidemia8,11. Ainda que maior número de casos de fungemia por Candida fosse esperado, em muitas ocasiões o diagnóstico clínico não foi confirmado, o que pode ser atribuído à baixa sensibilidade da hemocultura12.

A C. albicans é considerada a principal espécie causadora de fungemia na população geral. Em estudo multicêntrico realizado em 11 hospitais de nove cidades brasileiras, C. albicans foi responsável por 41% dos casos, seguida por C. tropicalis (21%) e C. parapsilosis (21%)13.

O predomínio da C. albicans também foi observado em neonatos, com incidência dessa espécie superior a 50%9,14,15. No presente estudo não foi possível identificar a espécie de Candida em 22,2% dos casos, que tiveram como resultado Candida spp. A principal espécie isolada foi a C. albicans, porém o número de espécies de Candida não-C. albicans foi elevado.

A frequência de Candida não-C. albicans foi de 64,3% entre as espécies identificadas, semelhante ao encontrado em hospital terciário do nordeste brasileiro, onde a incidência de candidemia por espécies de Candida não-C. albicans foi de 71%16.

O predomínio de C. albicans está bem estabelecido na literatura, porém uma mudança na distribuição das espécies de Candida não-C. albicans tem sido cada vez mais observada17. Dentre as espécies de Candida não-C. albicans, C. parapsilosis foi a espécie mais identificada neste estudo, estando de acordo com dados encontrados na literatura9,18.

No entanto, em alguns estudos C. parapsilosis foi a principal causa de fungemia7,10. Para esses autores, a maior sobrevivência de prematuros de extremo baixo peso aumenta o número de procedimentos invasivos em UTIN. Tais procedimentos estariam associados aos episódios de candidemia por C. parapsilosis, pois este fungo tem grande capacidade de formar biofilmes em superfícies de cateter e contaminar soluções parenterais, além de estar relacionado a surtos nosocomiais por contaminação das mãos dos profissionais de saúde19.

A candidemia por C. albicans está associada à colonização prévia, transmitida verticalmente no momento do nascimento. Em contraste, a doença invasiva por C. parapsilosis pode ocorrer sem colonização prévia, transmitida de forma horizontal por fontes externas de contaminação, como: equipamentos médicos, fluidos alimentares, cateteres e mãos de profissionais da saúde18. Cuidados com esses materiais, bem como a higienização correta das mãos, são medidas que podem prevenir a infecção por esse patógeno.

O número elevado de casos por C. famata pode estar relacionado à contaminação das culturas no laboratório ou a dificuldades técnicas na identificação da espécie. Devido à natureza retrospectiva do estudo, não foi possível a reidentificação dessas amostras. É importante ressaltar que os casos de infecção causados por C. famata preenchiam critérios definidos de infecção de corrente sanguínea, com mortalidade elevada (cinco óbitos em oito casos).

A ocorrência de candidemia tem sido relacionada a diversos fatores de risco. No presente estudo, foi observado que neonatos com peso ao nascer inferior a 1.000 g, IG ≤ 32 semanas, uso prévio de CVC, NPP e mais de dois antibióticos parenterais tiveram maior risco de adquirir candidemia em relação aos controles.

Maior incidência de candidemia tem sido registrada em estudos que incluem recém-nascidos de baixo peso4. Em nossa casuística, peso inferior a 1.500 g foi considerado fator de risco para fungemias. Em estudo conduzido em unidade neonatal brasileira na Região Centro-Oeste, foi observado que recém-nascidos de baixo peso eram 4,4 vezes mais propensos a apresentarem candidemia do que o grupo controle. O peso acima de 2.500 g pode ser um fator protetor, porém, a casuística não foi suficiente para determinar uma relação estatística. Pooli et al9 referem relação inversa entre peso e risco de candidemia, sendo peso inferior a 1.500 g ao nascer um fator até 20 vezes maior para ocorrência da doença.

A relação entre prematuridade e fungemia com índices superiores a 90% tem tido diversos registros7,20,21. Saiman et al8 demonstraram relação significante entre idade gestacional inferior a 32 semanas e candidemia. Dados de UTI neonatais argentinas9 mostraram uma probabilidade de 13,65 vezes maior de adquirir ICS por Cândida em pacientes com IG ≤ a 32 semanas que o grupo de RNs a termo. No presente estudo, o risco de infecção neste grupo foi 2,8 vezes maior em relação ao grupo controle. IG ≥ a 37 semanas foi um fator protetor contra candidemia.

A prematuridade e o baixo peso são fatores importantes para infecção neonatal porque o sistema imunológico se encontra imaturo, o que facilita a entrada de microrganismos hospitalares potencialmente invasivos pela pele e mucosas22. Os níveis de IgG materna estão baixos na circulação, pois a transferência transplacentária que ocorre durante o terceiro trimestre de gravidez é interrompida. Mesmo com níveis séricos de IgG dentro da faixa da normalidade, as funções de opsonização e do sistema complemento são reduzidas em prematuros. A neutropenia é também um achado comum em prematuros infectados por Candida23.

Os RNs de extremo baixo peso, assim como os prematuros extremos, têm tempo de internação maior em UTI e, consequentemente, são expostos a diversos procedimentos invasivos, o que aumenta o risco de infecção.

O uso de NPP tem sido associado à candidemia9,24 com índices de 93% a 100% em neonatos3,7. A nutrição parenteral constitui substrato nutricional para os microrganismos, devido à presença de carboidratos, proteínas e, principalmente, de emulsões lipídicas. Uma possível contaminação durante seu preparo e manuseio pode ser de difícil controle. Além disso, a hiperglicemia decorrente da infusão de glicose é considerada outro fator predisponente à infecção25.

Em relação ao uso de CVC, o risco de candidemia foi 2,7 vezes maior que o do grupo controle, reforçando que a presença de CVC pode ser um dos fatores independentes para o desenvolvimento até 30 vezes maior de candidemia26,27,28,29. A relação entre uso de CVC e candidemia pode ser explicada pela capacidade de formação de biofilmes na superfície de cateteres, em especial por C. parapsilosis30, cuja incidência foi muito elevada em nosso estudo.

No presente estudo, 100% dos pacientes receberam antibioticoterapia prévia. Hinrichsen et al16 e França et al31 encontraram taxas superiores a 90%. Relação semelhante também foi encontrada por Al-Sweih et al10, Del Negro19. Para Gondin et al26, o uso prévio de antibiótico foi o principal fator de risco para candidemia em neonatos. Ademais, o uso de antibióticos contra anaeróbios da microbiota gastrointestinal pode estar associado ao aumento de taxa de candidemia, uma vez que essas bactérias inibem o crescimento fúngico no intestino27.

O uso prévio de carbapenêmicos é relatado como fator de risco significante para a ocorrência de candidemia32. Ainda que os carbapenêmicos tenham sido utilizados por 36% dos casos, a associação entre o uso desse antimicrobiano e a ocorrência de candidemia não teve significância estatística.

O maior problema em relação aos estudos sobre candidemia refere-se à dificuldade em se obter uma amostra representativa da doença. O número de casos não diagnosticados é alto, pois a sensibilidade da hemocultura é baixa (50%), o que gera grande número de resultados falsos negativos12.

Na maioria das vezes, o diagnóstico de fungemia é presuntivo e baseado em parâmetros clínicos. Nestes casos, é empregado o tratamento empírico, que é de alto custo e de significativa toxicidade. O conhecimento epidemiológico em relação à doença pode auxiliar nas condutas do profissional de saúde e melhorar o prognóstico da população de neonatos.

 

CONCLUSÃO

A ocorrência de candidemia foi de 15,1 por mil admissões na UTIN no período estudado, sendo C. albicans e C. parapsilosis as espécies responsáveis por mais de 50% dos episódios de infecção. Neonatos com extremo baixo peso que fizeram uso do CVC, NPP e terapia antimicrobiana com três ou mais drogas durante sua internação em unidade neonatal apresentaram risco aumentado de fungemia. Este estudo reforça a necessidade de se avaliar o impacto da profilaxia antifúngica na evolução clínica de recém-nascidos prematuros.

 

REFERÊNCIAS

1 Benjamin Junior DK, Stoll BJ, Fanaroff AA, McDonald SA, Oh W, Higgins RD, et al. Neonatal candidiasis among extremely low birth weight infants: risk factors, mortality rates, and neurodevelopmental outcomes at 18 to 22 months. Pediatrics. 2006 Jan;117(1):84-92. Doi:10.1542/peds.2004-2292 [Link]

2 Borges RM, Soares LR, Brito CS, Brito DVD, Abdallah VOS, Gontijo Filho PP. Risk factors associated with colonization by Candida spp in neonates hospitalized in Neonatal Intensive Care Unit in Brazil. Rev Soc Bras Med Trop. 2009 Jul-Aug;42(4):431-5. Doi:10.1590/S0037-86822009000400014 [Link]

3 Gibelli MABC. Fatores de risco para fungemia em recém-nascidos de muito baixo peso [dissertação]. São Paulo (SP): Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina; 2009. [Link]

4 Vendettuoli V, Tana M, Tirone C, Posteraro B, La Sorda M, Fadda G, et al. The role of Candida surveillance cultures for identification of a preterm subpopulation at highest risk for invasive fungal infection. Pediatr Infect Dis J. 2008 Dec;27(12):1114-6. Doi:10.1097/INF.0b013e31817fce78 [Link]

5 Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Neonatologia: critérios nacionais de infecção relacionadas à assistência à saúde: manual de definição dos critérios nacionais de infecções relacionadas à assistência à saúde. 2008; p. 1-69. [Link]

6 Kossoff EH, Buescher ES, Karlowicz MG. Candidemia in a neonatal intensive care unit: trends during fifteen years and clinical features of 111 cases. Pediatr Infect Dis J. 1998 Jun;17(6):504-8. [Link]

7 Blyth CC, Chen SCA, Slavin MA, Serena C, Nguyen Q, Marriott D, et al. Not just little adults: candidemia epidemiology, molecular characterization, and antifungal susceptibility in neonatal and pediatric patients. Pediatrics. 2009 May;123(5):1360-8. Doi:10.1542/peds.2008-2055 [Link]

8 Saiman L, Ludington E, Pfaller M, Rangel-Frausto S, Wiblin RT, Dawson J, et al. Risk factors for candidemia in Neonatal Intensive Care Unit patients. Pediatr Infect Dis J. 2000 Apr;19(4):319-24. [Link]

9 Pooli DL, Fasolino MN, Pereda R, Rial MJ, Califano G. Candidemia en una Unidad de Cuidados Intensivos Neonatales: identificación de factores de riesgo. Arch Argent Pediatr. 2006 sep-oct;104(5):393-8. [Link]

10 Al-Sweih N, Khan Z, Khan S, Devarajan LV. Neonatal candidemia in Kuwait: a 12-year study of risk factors, species spectrum and antifungal susceptibility. Mycoses. 2009 Nov;52(6):518-23. Doi:10.1111/j.1439-0507.2008.01637.x [Link]

11 Fridkin SK, Kaufman D, Edwards JR, Shetty S, Horan T. Changing incidence of Candida bloodstream infections among NICU patients in the United States: 1995-2004. Pediatrics. 2006 May;117(5):1680-7. Doi: 10.1542/peds.2005-1996 [Link]

12 Alonso-Valle H, Acha O, García-Palomo JD, Fariñas-Alvarez C, Fernández-Mazarrasa C, Fariñas MC. Candidemia in terciary care hospital: epidemiology and factors influencing mortality. Eur J Clin Microbiol Infect Dis. 2003 Apr;22(4):254-7. [Link]

13 Colombo AL, Nucci M, Park BJ, Nouér SA, Arthington-Skaggs B, Matta DA, et al. Epidemiology of candidemia in Brazil: a nationwide sentinel surveillance of candidemia in eleven medical centers. J Clin Microbiol. 2006 Aug;44(8):2816-23. Doi:10.1128/JCM.00773-06 [Link]

14 Shetty SS, Harrison LH, Hajjeh RA, Taylor T, Mirza SA, Schmidt AB, et al. Determining risk factors for candidemia among newborn infants from population-based surveillance: Baltimore, Maryland, 1998-2000. Pediatr Infect Dis J. 2005 Jul;24(7):601-4. [Link]

15 Badran EF, Al Baramki JH, Al Shamyleh A, Shehabi A, Khuri-Bulos N. Epidemiology and clinical outcome of candidemia among Jordanian newborns over a 10-year period. Scand J Infect Dis. 2008;40(2):139-44. [Link]

16 Hinrichsen SL, Falcão E, Vilella TAS, Colombo AL, Nucci M, Moura L, et al. Candidemia em hospital terciário do nordeste do Brasil. Rev Soc Bras Med Trop. 2008 jul-ago;41(4):394-8. Doi:10.1590/S0037-86822008000400014 [Link]

17 Miranda LN, van der Heijden IM, Costa SF, Sousa API, Sienra RA, Gobara S, et al. Candida colonisation as a source for candidemia. J Hosp Infect. 2009 May;72(1):9-16. Doi: 10.1016/j.jhin.2009.02.009 [Link]

18 Festekjian A, Neely M. Incidence and predictors of invasive candidiasis associated with candidemia in children. Mycoses. 2011 Mar;54(2):146-53. Doi:10.1111/j.1439-0507.2009.01785.x [Link]

19 Del Negro GMB. Identificação de cinco espécies de Candida pela reação em cadeia da polimerase (PCR) e por hemocultura em pacientes pediátricos com risco para candidemia [tese]. São Paulo (SP): Universidade de São Paulo; 2008. [Link]

20 Xavier PCN, Chang MR, Nunes MO, Palhares DB, Silva RA, Bonfim GF, et al. Candidemia neonatal, em hospital público do Mato Grosso do Sul. Rev Soc Bras Med Trop. 2008 set-out;41(5):459-63. Doi:10.1590/S0037-86822008000500005 [Link]

21 Conde-Rosa A, Amadeu R, Perrez-Torres D, Colón E, Sánches-Rivera C, Nieves-Plaza M, et al. Candidemia distribution, associated risk factors, and attributed mortality at a university-based medical center. P R Health Sci J. 2010 Mar;29(1):26-9. [Link]

22 Manzoni P. Use of Lactobacillus casei subspecies Rhamnosus GG and gastrointestinal colonization by Candida species in preterm neonates. J Pediatr Gastroenterol Nutr. 2007 Dec;45 Suppl 3:190-4. Doi:10.1097/01.mpg.0000302971.06115.15 [Link]

23 Mahieu LM, Van Gasse N, Wildemeersch D, Jansens H, leven M. Number of sites of perinatal Candida colonization and neutropenia are associated with nosocomial candidemia in the neonatal intensive care unit patient. Pediatr Crit Care Med. 2010 Mar;11(2):240-5. Doi:10.1097/PCC.0b013e3181b808fb [Link]

24 Brito DVD, Brito CS, Resende DS, Moreira do ÓJ, Abdallah VOS, Gontijo Filho PP. Nosocomial infections in a Brazilian neonatal intensive care unit: a 4-year surveillance study. Rev Soc Bras Med Trop. 2010 Nov-Dec;43(6):633-7. Doi:10.1590/S0037-86822010000600006 [Link]

25 Opilla M. Epidemiology of bloodstream infection associated with parenteral nutrition. Am J lnfect Control. 2008 Dec;36(10):S173.e5-8. Doi:10.1016/j.ajic.2008.10.007 [Link]

26 Gondim BA, Brito DVD, Brito CS, von Dolinger EJO, Abdallah VOS, Gontijo Filho PP. Fatores de risco para colonização e sepse por Candida albicans e Candida não albicans em neonatos críticos. Arq Cienc Saude. 2009 jul-set;16(3):105-9. [Link]

27 Zaoutis TE, Prasad PA, Localio AR, Coffin SE, Bell LM, Wash TJ, et al. Risk factors and predictors for candidemia in pediatric intensive care unit patients: implications for prevention. Clin lnfect Dis. 2010 Sep;51(5):e38-45. Doi:10.1086/655698 [Link]

28 Nunes MO. Epidemiologia de candidemias e perfil de susceptibilidade das leveduras do gênero Candida em hospital universitário de Mato Grosso de Sul [dissertação]. Campo Grande (MS): Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; 2009. [Link]

29 O'Grady NP, Alexander M, Burns LA, Dellinger EP, Garland J, Heard SO, et al. Guidelines for the prevention of intravascular catheter-related infections. Am J Infect Control. 2011 May;39(4 Suppl 1):S1-S34. Doi: 10.1016/j.ajic.2011.01.003 [Link]

30 Almirante B, Rodríguez D, Cuenca-Estrella M, Almeida M, Sanchez F, Ayats J, et al. Epidemiology, risk factors, and prognosis of Candida parapsilosis bloodstream infections: case-control population-based surveillance study of patients in Barcelona, Spain, from 2002 to 2003. J Clin Microbiol. 2006 May;44(5):1681-5. Doi:10.1128/JCM.44.5.1681-1685.2006 [Link]

31 França JCB, Ribeiro CEL, Queiroz-Telles F. Candidemia em um hospital terciário brasileiro: incidência, freqüência das diferentes espécies, fatores de risco e susceptibilidade aos antifúngicos. Rev Soc Bras Med Trop. 2008 jan-fev;41(1):23-8. Doi:10.1590/S0037-86822008000100005 [Link]

32 Benjamin Junior DK, DeLong ER, Steinbach WJ, Cotton CM, Walsh TJ, Clark RH. Empirical therapy for neonatal candidemia in very low birth weight infants. Pediatrics. 2003 Sep;112(3 Pt 1):543-7. [Link]

 

 

Correspondência / Correspondence / Correspondencia:
Irna Carla do Rosário Souza Carneiro
Rua Domingos Marreiros, 307. Bairro: Umarizal
CEP: 66050-210 Belém-Pará-Brasil
Tel.: +55 (91) 8874-4308 / (91) 8116-8230 / 3181-7000
E-mail: irnajula@uol.com.br

Recebido em / Received / Recibido en: 17/2/2012
Aceito em / Accepted / Aceito en: 12/8/2013