INTRODUÇÃO
A hanseníase é uma doença passível de transmissão e de caráter crônico, cujo agente patogênico é o Mycobacterium leprae. É uma doença que alcança qualquer sexo ou faixa etária e, quando não tratada, pode causar deformidades e incapacidades físicas, muitas vezes irreversíveis1.
Em 2022, a Organização Mundial da Saúde registrou 21.398 novos casos de hanseníase na região das Américas, representando 12,3% do total global de casos. O Brasil ocupa o segundo lugar na relação de países com maior número de casos novos da doença no mundo, com 19.635 notificações, e lidera nas Américas2,3.
Há predomínio da doença nas Regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste do Brasil, com destaque para os estados hiperendêmicos Goiás e Mato Grosso, representando a Região Centro-Oeste, Maranhão e Piauí, a Região Nordeste e Tocantins, a Região Norte4.
As moradias inadequadas estão firmemente associadas à dispersão da hanseníase, tanto na incidência da população geral, quanto em menores de 15 anos de idade. O convívio domiciliar contínuo com o doente sem tratamento, associado a um espaço limitado e com baixas condições de salubridade, promovem a vulnerabilidade ao adoecimento de adultos e menores de 15 anos que compartilham esses espaços com pessoas sem diagnóstico estabelecido e tratamento adequado5.
Para alcançar a eliminação da hanseníase e os impactos causados por ela, intervenções médicas não são suficientes. À medida que a interrupção da transmissão avança, também é preciso abordar os aspectos sociais e psicológicos da doença6.
A redução e a eliminação dos casos de hanseníase em crianças e adolescentes passou a ser prioridade do Programa Nacional de Controle da Hanseníase da Secretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente do Ministério da Saúde. Este fato requer a ação imediata em localidades hiperendêmicas, como o estado do Pará, que registrou uma taxa de 9,63 casos novos/100.000 habitantes em menores de 15 anos no ano de 2017, ficando acima da taxa nacional de 3,72 casos novos/100.000 habitantes4. Dessa maneira, o objetivo deste estudo é investigar a ocorrência e as características sociodemográficas e clínicas dos casos de hanseníase em menores de 15 anos no estado do Pará, a fim de promover orientação para melhorias práticas no controle da doença.
MATERIAIS E MÉTODOS
ASPECTOS ÉTICOS
Foram utilizados dados secundários de domínio público, recebendo a dispensa do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos da Universidade do Estado do Pará, sob o parecer nº 6.081.026/2023. A pesquisa seguiu os princípios fundamentais da bioética, estabelecidos nas normas internacionais e na Resolução nº 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.
DESENHO, LOCAL, POPULAÇÃO, PERÍODO DO ESTUDO E COLETA DE DADOS
Trata-se de um estudo observacional descritivo, de caráter epidemiológico e ecológico, com análise espaço-temporal da hanseníase em menores de 15 anos de idade no estado do Pará, Brasil, segundo casos novos notificados e confirmados no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN), no período de 01/01/2018 a 31/12/2022.
O estado do Pará, posicionado na Região Norte do Brasil, é composto por 144 municípios, tendo Belém como capital. Possui área territorial de 1.245.870,700 km², população estimada de 8.777.124 pessoas e Índice de Desenvolvimento Humano de 0,697,8. Neste estudo, foi dividido em quatro macrorregiões de saúde, caracterizadas pelos numerais I, II, III e IV.
As informações referentes à população do estudo foram obtidas de fonte secundária (ficha de notificação de hanseníase) disponibilizadas no SINAN do período de 01/01/2018 a 31/12/2022, por meio da Diretoria de Vigilância em Saúde da Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará (DVS/SESPA).
INCLUSÃO E EXCLUSÃO
O estudo incluiu dados de menores de 15 anos com residência identificada em um dos 144 municípios que compõem o estado do Pará. Foram excluídos casos de transferências de outro país ou estado, recidivas e outros reingressos (modos de entrada), município ignorado, erro diagnóstico e duplicidade de informações.
VARIÁVEIS E INDICADORES (CÁLCULO E FÓRMULA APLICADA)
As variáveis de interesse foram: sociodemográficas (faixa etária, sexo, raça/cor, escolaridade e zona de residência); clínicas-epidemiológica (forma clínica, grau de incapacidade, modo de detecção, baciloscopia e classificação operacional); e o indicador taxa de detecção de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos.
Para calcular o indicador taxa de detecção de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos no Pará, por macrorregião de saúde paraense e para cada ano da série histórica, obedeceu-se ao que preconiza o Ministério da Saúde, considerando o local de residência. Os dados populacionais do estado e de cada macrorregião de saúde aplicados no cálculo do indicador foram coletados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, por ano, no período avaliado. Para o indicador da taxa de detecção, foi aplicada a seguinte fórmula:

PROCESSAMENTO E ANÁLISE ESTATÍSTICA DOS DADOS
Para a construção de tabelas e gráficos, bem como a análise de tendência da taxa de detecção da doença, foi utilizado o programa Microsoft Excel 2019. A análise descritiva foi realizada aplicando tabelas de frequência absoluta e relativa. As diferenças proporcionais foram verificadas pelo teste do qui-quadrado de aderência. A avaliação da percentagem acumulada das notificações em cada macrorregião de saúde paraense foi feita pelo gráfico de Pareto. Em todos os testes, as análises consideraram nível de significância de p < 0,05.
RESULTADOS
Foram diagnosticados 929 casos novos de hanseníase em menores de 15 anos no estado do Pará de 2018 a 2022. A maioria era do sexo masculino (53,61%), da faixa etária entre 10 e 14 anos (72,23%), raça/cor parda (78,58%), grau de escolaridade da 5ª à 8ª série do Ensino Fundamental (antigo ginásio ou 1° grau) (43,92%), com residência na zona urbana (74,81%). Houve diferença significativa (p ≤ 0,05) na proporção de casos entre todas as variáveis sociodemográficas (Tabela 1).
Tabela 1 - Perfil sociodemográfico de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos de idade no estado do Pará, Brasil, de 2018 a 2022
Variáveis | n = 929 | % | p-valor* |
---|---|---|---|
Sexo | |||
Feminino | 431 | 46,39 | 0,0339 |
Masculino | 498 | 53,61 | |
Faixa etária (anos) | |||
0 a 4 | 18 | 1,94 | <0,0001 |
5 a 9 | 240 | 25,83 | |
10 a 14 | 671 | 72,23 | |
Raça/cor | |||
Branca | 74 | 7,97 | <0,0001 |
Preta | 99 | 10,66 | |
Amarela | 9 | 0,97 | |
Parda | 730 | 78,58 | |
Indígena | 5 | 0,54 | |
Ignorado | 12 | 1,29 | |
Escolaridade | |||
Analfabeto | 4 | 0,43 | <0,0001 |
1ª a 4ª série do Ensino Fundamental (antigo 1° grau) | 327 | 35,20 | |
5ª à 8ª série do Ensino Fundamental (antigo ginásio ou 1° grau) | 408 | 43,92 | |
Ensino Médio (antigo colegial ou 2° grau) | 33 | 3,55 | |
Ignorado | 91 | 9,80 | |
Não se aplica | 66 | 7,10 | |
Zona | |||
Urbana | 695 | 74,81 | <0,0001 |
Rural | 221 | 23,79 | |
Periurbana | 1 | 0,11 | |
Ignorado | 12 | 1,29 |
Fonte: Elaborado a partir de dados da DVS/SESPA, 2023.
* Teste do qui-quadrado de aderência.
A classificação operacional predominante foi a multibacilar (65,66%), e a forma clínica dimorfa foi a mais comum (52,85%) (Tabela 2). Quanto ao grau de incapacidade física no momento do diagnóstico, 76,32% dos casos não possuíam qualquer incapacidade; no entanto, 19,59% apresentaram algum grau de incapacidade física no momento do diagnóstico e os 4,09% restante não possuíam classificação informada (Tabela 2).
Tabela 2 - Características clínicas e epidemiológicas de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos de idade no estado do Pará, Brasil, de 2018 a 2022
Variáveis | n = 929 | % | p-valor* |
---|---|---|---|
Classificação operacional | |||
Multibacilar | 610 | 65,66 | <0,0001 |
Paucibacilar | 319 | 34,34 | |
Forma clínica | |||
Indeterminada | 205 | 22,07 | <0,0001 |
Tuberculoide | 123 | 13,24 | |
Dimorfa | 491 | 52,85 | |
Virchowiana | 63 | 6,78 | |
Não classificada | 47 | 5,06 | |
Grau de incapacidade | |||
Zero | 709 | 76,32 | <0,0001 |
I | 136 | 14,64 | |
II | 46 | 4,95 | |
Não classificada | 38 | 4,09 | |
Modo de detecção | |||
Encaminhamento | 259 | 27,88 | <0,0001 |
Demanda espontânea | 336 | 36,17 | |
Exame de coletividade | 53 | 5,71 | |
Exame de contato | 140 | 15,07 | |
Outros modos | 8 | 0,86 | |
Ignorado | 133 | 14,32 | |
Baciloscopia | |||
Positiva | 177 | 19,05 | <0,0001 |
Negativa | 245 | 26,37 | |
Não realizada | 473 | 50,91 | |
Ignorado | 34 | 3,66 |
Fonte: Elaborado a partir de dados da DVS/SESPA, 2023.
* Teste do qui-quadrado de aderência.
No que tange ao atendimento da atenção básica no diagnóstico da hanseníase, a demanda espontânea foi a forma de detecção mais presente (36,17%), seguida por encaminhamento (27,88%). O diagnóstico complementar pela baciloscopia não foi realizado em 50,91% dos casos, evitando exposições traumáticas. Assim como nas variáveis sociodemográficas, as variáveis clínico-epidemiológicas mostraram diferenças estatisticamente significativas (p ≤ 0,05) quanto à proporção de casos (Tabela 2).
A análise temporal da taxa de detecção de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos no estado do Pará revelou um cenário de decréscimos significativos. Entre 2018 e 2019, considerado o período pré-pandemia de COVID-19, notou-se as primeiras variações, sugerindo melhorias na detecção e no manejo dos menores de 15 anos com hanseníase. No entanto, com a pandemia, os decréscimos foram intensificados durante os anos de 2020, 2021 e 2022, período de pico da COVID-19 que interrompeu as atividades dos serviços de saúde e, consequentemente, as notificações (Figura 1A).
A taxa de detecção de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos na macrorregião de saúde IV (MACRO IV) se manteve superior à taxa estadual ao longo de toda a série histórica (Figura 1B). Desse modo, sugere-se que essa macrorregião seja a principal responsável pelo elevado cenário endêmico de transmissão da hanseníase em menores de 15 anos no estado do Pará, uma vez que concentrou 44,02% dos casos novos da doença no período de estudo, seguida das macrorregiões I, II e III (MACRO I, II e III) que totalizaram 55,97% do percentual restante para número de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos (Figura 1C).
As demais macrorregiões de saúde (MACRO I, II e III) permaneceram abaixo da taxa estadual ao longo de toda a série histórica (Figura 1B). No entanto, não podem ser ignoradas, uma vez que são três áreas com forte influência econômica e social para o estado do Pará, e suas localizações e características socioeconômicas podem sustentar a condição da transmissão da hanseníase nesses locais.
DISCUSSÃO
No ano de 2018, o Pará obteve a terceira maior taxa de detecção de casos novos para a hanseníase (30,44 casos/100.000 habitantes) e a segunda maior taxa de detecção em menores de 15 anos no Brasil (11,10 casos/100.000 habitantes), quadro epidemiológico que o classificou como área com grande carga da doença no país9.
Conforme os dados nacionais, a tendência de redução de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos no período pré-pandemia da COVID-19 (2013 a 2019) já era observada4. No entanto, com o aparecimento da pandemia, essa tendência de redução intensificou, podendo ser observada na série histórica realizada por este estudo. A redução drástica de notificação de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos no Pará não se trata de uma atenuação da dispersão, mas um reflexo da interrupção das atividades assistências geradas pela centralização das ações em saúde no enfrentamento da COVID-19.
Este estudo revelou resultados equivalentes a uma pesquisa anterior quanto às variáveis escolaridade e raça/cor, com predomínio de novos casos de hanseníase em indivíduos com Ensino Fundamental incompleto e raça/cor parda; além disso, houve concordância nas variáveis sexo, faixa etária e na proporção de casos novos multibacilares entre o total de casos novos10. A maior ocorrência de hanseníase na faixa etária de 10 a 14 anos também foi relatada em estudo envolvendo um município do Mato Grosso, região endêmica que faz fronteira com o estado do Pará, onde identificou-se que a chance da hanseníase enfermar a faixa etária entre 8 e 14 anos foi 3,4 vezes maior do que a de 1 a 7 anos11.
A maioria dos casos notificados foram multibacilares em 65,66% (n = 610), caracterizando diagnóstico tardio pelos serviços de saúde, além da manutenção da transmissão da hanseníase pelas fontes ativas de M. leprae. No município de Buriticupu, no estado do Maranhão, vizinho ao Pará, a hanseníase na forma paucibacilar em menores de 15 anos é mais comum quando comparada ao estado do Pará, sendo a forma multibacilar evidenciada em uma idade avançada12.
Salienta-se a importância do diagnóstico precoce para evitar os casos multibacilares, em que a vigilância epidemiológica do município deve incentivar ações que promovam os exames de "contatos domiciliares/sociais". Este estudo encontrou baixa detecção por demanda de contato (15,07%), atrás dos modos demanda espontânea (36,17%) e encaminhamento (27,88%). A investigação dos contatos não deve ser restrita aos domicílios, visto que a avaliação de contatos não domiciliares é essencial para identificar as fontes da doença no meio social13.
O modo de detecção por demanda de contato é primordial. Há evidências de que 95% do adoecimento
na infância está relacionado com o contato familiar. O risco de desenvolver hanseníase é até nove vezes maior entre os contatos intradomiciliares e quatro vezes maior entre aqueles que têm contato com os vizinhos10.
Obteve-se a constatação de uma predominância do baixo grau de incapacidade 76,32% (n = 709). Porém, ressalta-se a presença de algum grau de incapacidade física no momento do diagnóstico em 19,59% (n = 182), indicando a presença da doença em estágios mais avançados em menores de 15 anos. A hanseníase, quando não diagnosticada precocemente, pode provocar sequelas físicas significativas14.
A elevada detecção de casos novos de hanseníase em crianças e adolescentes na MACRO IV implica em gravidade e transmissão ativa da doença na região sudeste do estado do Pará15, com os fluxos migratórios de pessoas em busca de melhorias de vida nas fronteiras com estados hiperendêmicos: Maranhão, a leste; Tocantins, a sudeste; e Mato Grosso, ao sul. Esses deslocamentos intensificam a vulnerabilidade social e a urbanização descontrolada10,16.
O indicador taxa de detecção de casos novos de hanseníase em menores de 15 anos por macrorregião aponta a MACRO IV como a possível responsável pela conservação do cenário endêmico de hanseníase em menores de 15 anos no Pará. Com isso, o serviço de saúde pública do estado consegue ter uma melhor perspectiva local da doença para o direcionamento de fundos para o controle e, assim, traçar planos de ações de vigilância em conjunto com os municípios da região, principalmente os localizados nas fronteiras com os estados hiperendêmicos (Maranhão, Tocantins e Mato Grosso).
A economia expressiva dos municípios da MACRO IV, localizados na região sudeste do estado do Pará, caracteriza-se por atividades como agricultura, pecuária, mineração, indústria e comércio17, que impulsionam o desenvolvimento local e despertam interesses por uma vida próspera.
As macrorregiões do Pará, incluindo a MACRO IV, desempenham funções sociais e econômicas que influenciam a prevalência da hanseníase, contribuindo para a manutenção de sua condição endêmica no estado. Fatores como desigualdade social, pobreza e precariedade em moradia e saneamento básico reforçam o status da hanseníase como um problema de saúde pública18. Nesse contexto, destaca-se a MACRO I, que inclui o município de Melgaço, identificado como o de pior índice de qualidade de vida do país7.
A MACRO II, a mais populosa do Pará, composta por 47 municípios, certamente contribui para a manutenção da endemicidade da hanseníase14. A MACRO III, por sua vez, apresenta a maior área de extensão territorial do estado, sendo o município de Altamira o maior do Brasil, com densidade demográfica de 0,79 habitantes/km². Apesar de ser um município pouco povoado, possui área de desenvolvimento de grandes projetos econômicos na Amazônia, que estimulam grandes fluxos migratórios, o crescimento urbano desordenado e a propagação da hanseníase19.
Além disso, a intensificação da exploração mineral ilegal de ouro na Floresta Nacional de Altamira, na bacia do Xingu, estimulou o desmatamento nessa região, comprometendo a sobrevivência dos povos indígenas e da população ribeirinha, gerando urbanização desordenada, além da disseminação da hanseníase19.
A heterogeneidade na detecção de casos novos de hanseníase na população menor de 15 anos no estado do Pará, analisada por macrorregiões de saúde ao longo do período avaliado, evidencia os significativos desafios para a sua erradicação. Essa questão exige a implementação de políticas públicas efetivas e a articulação entre as três esferas de gestão, com a busca pela maior eficiência em ações de saúde na rede que garantam melhorias no controle e eliminação da doença.
O acometimento de indivíduos menores de 15 anos pela hanseníase apresenta alterações na rotina desse público de maneira ampla e profunda, culminando, no âmbito educacional, em absenteísmo escolar em virtude de consequências da doença. Há um prejuízo de aprendizado e redução nas possibilidades de ascensão econômica e social por meio da escolaridade. Tal fato contribui para a manutenção dos baixos índices sociais e econômicos observados em países pobres e subdesenvolvidos20.
A educação em saúde é fundamental para capacitar profissionais da educação, da saúde e de organizações não governamentais no diagnóstico precoce da hanseníase em menores de 15 anos. Essa abordagem permite a identificação dos primeiros sinais da doença, estimula a adesão ao tratamento e previne o abandono terapêutico. A adoção de novas drogas no tratamento, técnicas avançadas de biologia molecular e sorológicas, além da ampliação do acesso a tecnologias que auxiliem no diagnóstico clínico, especialmente na atenção básica, alinhada às características de cada macrorregião de saúde do Pará, são estratégias fundamentais para interromper a cadeia de transmissão e melhorar os resultados para essa população21,22.
No entanto, a descentralização do acesso ao diagnóstico e ao tratamento da hanseníase, embora crucial, não deve ser a única estratégia para a eliminação da doença no estado. Faz-se necessário considerar fatores regionais, culturais, educacionais e socioeconômicos, além da expansão da investigação dos casos através da democratização do diagnóstico em um contexto multidisciplinar. Dessa maneira, pode-se alcançar o propósito da Estratégia Nacional para Enfrentamento da Hanseníase, a fim de evitar incapacidades e reduzir a transmissão da infecção na comunidade23,24,25.
CONCLUSÃO
O estudo evidenciou decréscimos nos casos de hanseníase em menores de 15 anos entre 2018 e
2022; porém, esses declínios foram intensificados por conta da pandemia de COVID-19, que redirecionou os esforços dos serviços de saúde pública, comprometendo as notificações.
Os dados sugerem falhas na cobertura dos serviços da atenção básica dos municípios, evidenciadas pela predominância da detecção por demanda espontânea e pela frequência de casos multibacilares, caracterizando atrasos no diagnóstico e falhas na vigilância dos contatos. Os prejuízos físicos causados pela hanseníase em crianças e adolescentes do estado do Pará permanecem significativos.
O crescimento acelerado e desordenado de áreas urbanas, impulsionado por grandes projetos econômicos na Amazônia, como os encontrados na MACRO IV, intensifica os fluxos migratórios e aumenta a vulnerabilidade social. Esse contexto favorece a disseminação da hanseníase, acometendo principalmente indivíduos imunologicamente mais vulneráveis em áreas com maiores comprometimentos estruturais. Na MACRO III, a exploração ilegal do ouro potencializa essa realidade.
Portanto, além dos fatores socioeconômicos, culturais e territoriais, o serviço de saúde público do estado do Pará conta com os desafios provocados por grandes projetos econômicos na Amazônia, que dificultam a erradicação da hanseníase em menores de 15 anos. Por isso, é necessário considerar as características de cada macrorregião de saúde para o planejamento do investimento em ações de saúde no combate a hanseníase, principalmente nas macrorregiões de fronteiras com outras áreas endêmicas.