SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.22 número1Helicobacter pylori: fatores relacionados à sua patogêneseAspectos do Escorpionismo no Estado do Pará-Brasil índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

  • Não possue artigos citadosCitado por SciELO

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Paraense de Medicina

versão impressa ISSN 0101-5907

Rev. Para. Med. v.22 n.1 Belém mar. 2008

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Estudo clínico-patológico das Glomerulopatias no Hospital de Clínicas Gaspar Vianna1

 

Glomerular diseases clinicopathologic profile at "Hospital de Clínicas Gaspar Vianna"

 

 

José Miguel Alves JúniorI; Renata Kelly Sousa PantojaII; Charlene Villacorta de BarrosIII; Marcelle Nobre BrazIII

IProfessor da Disciplina de Clínica Médica da Universidade do Estado do Pará – UEPA
IIMédica especialista em Nefrologia pela Universidade de São Paulo – USP
IIIMédicas graduadas pela Universidade do Estado do Pará- UEPA

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

OBJETIVO: estabelecer o perfil epidemiológico dos pacientes submetidos à biópsia renal na Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (FHCGV), além de conhecer a síndrome clínica e o diagnóstico histológico mais prevalentes, realizando ainda correlação clínico-patológica.
MÉTODO: avaliados, em estudo transversal, 32 pacientes, de ambos os sexos, submetidos à biópsia renal no Serviço de Nefrologia da FHCGV, de 2002 a 2005. Os dados referentes à identificação, história clínica e diagnóstico histológico foram coletados do Livro de Registros de Biópsia Renal do hospital, anotados em protocolo próprio e analisados quanto ao perfil clínico-patológico dos pacientes, sendo submetidos, posteriormente, à avaliação estatística.
RESULTADOS: foi observado predomínio de adultos (94%) na amostra estudada, sendo 56% da mesma composta por homens e 62% de pardos. Apenas, pequena parcela das biópsias apresentou complicações (três pacientes). A síndrome clínica mais prevalente foi a nefrótica (72%), seguida de hematúria (25%). Glomeruloesclerose segmentar e focal (GESF) (22%) e nefrite lúpica (15%) foram associados à síndrome nefrótica na maioria dos casos.
CONCLUSÃO: a síndrome clínica e a lesão histológica mais freqüentes na FHCGV neste período foram, respectivamente, nefrótica e GESF, sendo este último associado àquela em 57% dos casos.

DESCRITORES: biópsia renal; glomerulopatias.


SUMMARY

OBJECTIVE: to establish the epidemiologic profile of Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (FHCGV) patients submitted to renal biopsy and identify the most common kidney diseases biopsed and related clinical syndromes, formulating clinical and pathologic correlations.
METHODS: a retrospective study was undertaken of all renal biopsy registries performed from 2002 to 2005 at Nephrology Service of FHCGV. Data were obtained from Kidney Biopsies Registry Book, which contained personal, clinical and histological data of 32 patients, of both sexes.
RESULTS: adults composed most part of the sample (94%) and 56% of all patients were male. Only three subjects underwent biopsies complicationsf. The most common clinical syndrome was nephritic syndrome (72%), followed by hematuria (25%). Focal segmental glomerulosclerosis (FSGS) (22%) and lupus nephritis (15%) were associated to nephrotic syndrome in most of cases.
CONCLUSION: nephrotic syndrome and FSGS were the most frequent clinical and histological findings at FHCGV, respectively.

KEY WORDS: Kidney diseases, biopsy.


 

 

INTRODUÇÃO

A importância da função glomerular na fisiologia renal e o fato de suas lesões afetarem outros segmentos do néfron caracterizam as enfermidades glomerulares, como um dos principais problemas em Nefrologia nos dias de hoje.1

A injúria glomerular resultante de diversas nosologias renais e sistêmicas é uma das principais causas de doença renal terminal (DRT).2,3

Em função disso, doenças sistêmicas e renais específicas que podem desencadear a disfunção glomerular, devem ser reconhecidas, precocemente, proporcionando, assim, o estabelecimento do diagnóstico, tratamento adequado e prognóstico.4

Portanto, as investigações epidemiológicas acerca das glomerulopatias geram dados capazes de melhorar a compreensão fisiopatológica dessas doenças, de estimular pesquisas e desenvolvimento de novos paradigmas para o problema.5

De acordo com dados da literatura, as glomerulopatias são as causas mais comuns de falência renal na Austrália e Nova Zelândia, onde representam 35% de todas as doenças renais primárias.6 No Brasil, esta entidade é uma das causas mais comuns de falência renal, sendo responsável por 27,5% dos transplantes realizados.7,8

De acordo com diversos estudos, a nefropatia por IgA é a patologia renal mais biopsiada no mundo, prevalecendo em países como Espanha9, Portugal10,11, Itália12,13, Japão14, Coréia15, China16 e em Victoria, na Austrália17. Contudo, essa prevalência é, significativamente, menor nos registros de Kentucky (EUA), Nova Caledônia (Austrália) e Macedônia, onde se observa a glomerulonefrite membranosa (GNM) com maior freqüência. Na Arábia Saudita, Uruguai, alguns centros médicos norte-americanos (Chicago, Nova Iorque e Massachussetts) e inclusive no Brasil encontra-se maior número de padrões histológicos de glomeruloesclerose focal e segmentar (GESF).5,7,14

No que diz respeito à indicação clínica mais comum para a investigação de doença renal, a síndrome nefrótica constitui-se na apresentação clínica mais freqüente em países como Portugal10, Espanha14,18, Emirados Árabes19 e Brasil5,7. A ferramenta essencial na determinação da natureza e severidade das doenças glomerulares, que estabelece a extensão da injúria morfológica e o diagnóstico específico em pacientes com disfunção renal é, sem dúvida, a biópsia renal.4,10,20,21,22

A biópsia renal não deve ser analisada isoladamente, visto que, a clínica do paciente é o fator base para sua indicação, bem como a avaliação da evolução do mesmo. Sendo assim, torna-se imprescindível a correlação entre o diagnóstico clínico e o histológico, em virtude de diferentes condições glomerulares poderem resultar numa mesma síndrome clínica.21

Para que esta correlação seja eficaz, é preciso que haja dados fidedignos dos pacientes submetidos à biópsia renal.23,24

O objetivo dos dados epidemiológicos baseia-se na identificação de subgrupos de doenças renais para estudos detalhados e seleção de pacientes adequados para inclusão em ensaios terapêuticos.12 Todavia, a escassez de pesquisas neste âmbito em nosso país e a heterogeneidade da população brasileira em suas características étnicas, socioeconômicas e geográficas reforçam a necessidade de se implementarem estudos sobre doenças glomerulares no Brasil.5,8,17

Na região Norte, os serviços de Nefrologia que realizam biópsias renais são, relativamente, recentes e insuficientes, o que leva à falta de protocolos firmados sobre glomerulopatias e suas síndromes clínicas relacionadas.

Particularmente em Belém, Pará, não foram estabelecidos registros de biópsias que possam fornecer um perfil epidemiológico. As biópsias renais são realizadas apenas no Hospital Ofir Loyola (HOL), na Fundação Santa Casa de Misericórdia do Pará (FSCMP) e na Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna (FHCGV), o qual é a instituição mais recente neste serviço, tendo iniciado a execução deste procedimento em seu Setor de Nefrologia, em agosto de 2002.

 

OBJETIVO

Estabelecer o perfil epidemiológico dos nefropatas submetidos à biópsia renal na Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna, de 2002 a 2005, além de verificar a síndrome clínica e o diagnóstico histológico mais freqüentes neste período, realizando ainda a correlação clínicopatológica entre esses dados.

 

MÉTODO

Realizado estudo transversal de uma série de 32 pacientes, de ambos os sexos, entre 9 e 53 anos de idade, submetidos à biópsia renal no Serviço de Nefrologia da Clínica Médica do FHCGV, internados no período de agosto/2002 a agosto/2005.

Todos os pacientes com indicação para biópsia renal realizaram avaliação ultrassonográfica prévia à biópsia renal.

A orientação ecográfica em tempo real foi utilizada em todos os casos, bem como o uso de pistola automática.

Três fragmentos de tecido renal eram então retirados para leitura anátomo-patológica e enviados a um serviço de patologia especializada (Dr. Luiz A. R. Moura, São Paulo, SP).

Todos os dados pré e pós-biópsia foram catalogados nas Fichas de Biópsia Renal, sendo analisados posteriormente os registros de todos os pacientes submetidos ao procedimento; contudo, aqueles que apresentaram diagnóstico histológico diferente de glomerulopatia foram excluídos da correlação clínico-patológica, participando somente da elaboração do perfil clínico-epidemiológico.

Pacientes menores que 15 anos de idade foram classificados como crianças, aqueles na faixa etária entre 15 e 65 anos como adultos e os de faixa etária superior como idosos.

Quanto à raça, os pacientes foram classificados subjetivamente em brancos, pardos e negros. Com o objetivo de aumentar o valor estatístico do estudo, em algumas análises pardos e negros foram incluídos na mesma categoria.

As síndromes clínicas foram classificadas baseado na classificação proposta por Jennette e Falk (2001).25

A síndrome nefrótica foi definida como proteinúria maior que 3,0g/dia e albumina sérica menor que 3,0g/dl; não foi constituinte essencial da definição hiperlipidemia (colesterol sérico total > 200mg/dl e/ou triglicerídeos > 150mg/dl), embora tenha sido levada em consideração quando presente.

A síndrome nefrítica foi caracterizada como início súbito de hematúria (macro ou microscópica, com dismorfismo eritrocitário), hipertensão (PA ≥ 140x90 mmHg), oligúria (débito urinário < 400ml/dia), edema e redução na taxa de filtração glomerular (baseada no clearance de creatinina estimado – ClCr < 90 ml/min). Embora não fosse essencial que todas estas alterações estivessem presentes, a hematúria deveria sempre ser encontrada, associada a pelo menos uma das outras anormalidades.

A proteinúria isolada ou subnefrótica foi definida como proteinúria < 3,0g/dia.

Considerou-se hematúria patológica a presença de três ou mais hemácias por campo no EAS. Quando diagnosticada apenas pelo sedimento urinário, foi definida como hematúria microscópica. Se a presença de sangue na urina fosse suficiente para alterar sua coloração, caracterizaria-se hematúria macroscópica.

Glomerulonefrite rapidamente progressiva foi caracterizada como declínio rápido da função renal, cujas manifestações clínicas mais comumente encontradas foram hematúria, proteinúria, diminuição do volume urinário, edema e hipertensão arterial.

Falência renal crônica foi definida como redução da taxa de filtração glomerular e do tamanho renal, com aumento da ecogenicidade, além de creatinina sérica > 3mg/dl.

As doenças glomerulares foram classificadas de acordo com as Recomendações da Sociedade Brasileira de Nefrologia (2005).26

Foram consideradas amostras não representativas os materiais enviados à análise histopatológica que apresentassem menos de cinco glomérulos na MO ou ausência de glomérulos na IFD.

Os resultados foram anotados no protocolo do trabalho e submetidos a análises correlacionando o diagnóstico clínico e o histológico das amostras biopsiadas. Em seguida, foi realizada análise estatística.

De acordo com a natureza das variáveis, a análise estatística se realizou no programa Bio Estat 3.027 com o teste do Qui-Quadrado (χ2), em todos os resultados obtidos neste trabalho. Nos casos em que ocorreram freqüências observadas menores do que cinco, foi aplicado a correção de Yates para continuidade no valor do Qui-Quadrado.28

 

DISCUSSÃO

A glomerulonefrite é uma das causas mais comuns de doença renal terminal em países subdesenvolvidos.29

Neste estudo, as patologias mais encontradas em biópsias renais, representam 81,25% das biópsias (TABELA I), sendo a glomerulopatia primária a mais prevalente (p<0,01). Estes dados concordam com Llanes e col. (2002)4, Schena e col. (1997)12 e Yahya e col. (1998)19, os quais encontraram, respectivamente, 66,5%, 59,9% e 77,1% de glomerulopatias primárias.

 

 

Rivera e col. (1999)18 encontraram em seu estudo 71,2% de adultos e uma população de idosos três vezes maior que o número de crianças. Isto reflete o envelhecimento da população atendida em grandes centros de nefrologia. Este estudo apresenta 93,75% de adultos (TABELA II); entretanto, não houve biópsias em idosos. Ocorrência similar também foi observada na Itália12, com 93% de adultos em seus estudos e nos Emirados Árabes19, onde os mesmos correspondiam a todos os pacientes submetidos à biópsia renal.

 

 

 

 

Isto pode ser explicado em função da população atendida na FHCGV ser, predominantemente, de adultos. Além disso, as indicações de biópsias renais em idosos tendem a ser mais conservadoras, visto que a presença de comorbidades e a concepção de que existe perda de massa renal e de filtração glomerular inexorável com o envelhecimento, contribuem para uma atitude de reserva em relação a procedimentos diagnósticos invasivos e intervenções terapêuticas.30

Em relação ao sexo (TABELA II), os dados encontrados na literatura evidenciam um discreto predomínio do sexo masculino, com 65% nos registros da Itália12, 57,5% em Hong Kong31 e 52% no Brasil32, além de estudos espanhóis14, coreanos15 e australianos17 também corroborarem estes achados. Em concordância, neste estudo foi encontrada uma razão de 1,2:1 do sexo masculino em relação ao feminino (p>0,05). Todas as glomerulopatias secundárias foram diagnosticadas em mulheres, provavelmente, porque todas as biópsias classificadas como tal eram nefrite lúpica, patologia esta mais freqüente no sexo feminino.33

Quanto à raça, Braden e col. (2000)34, Castro e col. (2002)1 e Oliveira e col. (2002)5 evidenciaram em suas pesquisas uma prevalência de brancos com 59,5%, 53,1% e 66,6%, respectivamente. Em discordância com os dados da literatura, observou-se 81,25% de pardos e negros neste trabalho.

A miscigenação étnica e os critérios subjetivos utilizados para a caracterização de padrão racial neste estudo implicam em baixa confiabilidade dos dados sobre este propósito, visto que a classificação racial utilizada foi baseada em informações de prontuários, portanto motivo de questionamentos quanto à validade desta variável.

A síndrome clínica mais prevalente neste trabalho foi a nefrótica (p<0,01), seguida de hematúria (TABELA IV). Este achado coincide com dados dos Emirados Árabes19, Cingapura21, Espanha14,35, Índia36, Portugal10 e Brasil5,7. Bahiense-Oliveira e col. (2004)7 sugerem que o aumento na freqüência relativa de síndrome nefrótica nos últimos anos deva-se a mudanças nos critérios de indicação de biópsia renal.

 

 

Em contrapartida, países como Cuba4 e Itália12 referem as anormalidades urinárias assintomáticas como quadro clínico mais observado. O predomínio desta apresentação se deve, possivelmente, aos altos índices de nefropatia por IgA nestes países, achado histológico freqüentemente associado a esta clínica, como descrito na literatura. Além disso, variações geográficas nas políticas de triagem e indicações para realização de biópsia renal podem justificar estas discordâncias.37

Ao analisar, isoladamente, a clínica dos pacientes submetidos à biópsia renal, observou-se a superposição de algumas síndromes, sendo a associação mais freqüente a síndrome nefrótica com hematúria (quatro pacientes). Outras associações foram menos freqüentes.

A literatura científica brasileira destaca a GESF como o padrão histológico mais freqüentemente diagnosticado em biópsias renais em nosso país5,7,32. Constatou-se a prevalência deste padrão morfológico na FHCGV, o qual foi responsável por 22% (p<0,05) dos diagnósticos histológicos deste hospital (TABELA IV). No entanto, o pequeno número de pacientes prejudicou a avaliação estatística entre as diferentes informações encontradas no presente estudo.

Diversas hipóteses foram sugeridas para justificar este fato. É provável, por exemplo, que a freqüência aumentada de GESF esteja sendo influenciada pela seleção de pacientes jovens e nefróticos5, o que pôde ser comprovado nesta pesquisa. Além disso, sendo a GESF a via final comum de diversas doenças, o aumento na freqüência relativa desta patologia pode ser superestimado em estudos que não avaliam a evolução dos pacientes biopsiados.7

A segunda glomerulopatia mais freqüente na amostra estudada foi a nefrite lúpica, correspondendo a 100% das glomerulopatias secundárias. Dados de Manaus e Uberlândia coincidem com este achado, visto que nestas cidades a nefrite lúpica alcançou índices de 73% e 85%, respectivamente.

Segundo o Registro Paulista de Glomerulopatias (2002)5, a ocorrência elevada de GESF e nefrite lúpica sugere que estas sejam as principais lesões encontradas em pacientes biopsiados no Brasil. Em outros países como Arábia Saudita, Uruguai e alguns centros norte-americanos, a GESF é igualmente mais prevalente.5,7,14 No entanto, a literatura afirma que a nefropatia por IgA é a glomerulopatia primária mais comum em todo o mundo.16 Alguns autores admitem inclusive que aproximadamente 50% dos casos podem evoluir para DRT em 20 anos, apresentando ainda sobrevida renal em torno de 80% a 88% em 10 anos.16,38,39

Diferente dos dados anteriores, a glomerulonefrite membranosa apresenta-se como o achado histológico mais comum na Macedônia.29 Esta patologia foi a segunda glomerulopatia primária mais freqüente neste estudo, coincidindo com dados dos registros brasileiros de Manaus, Curitiba e São Paulo5, além de outros países como Portugal10, Itália12, Emirados Árabes19, Estados Unidos34 e França.40

Ao correlacionar as síndromes clínicas com os achados histológicos da amostra estudada (TABELA V), observou-se que a síndrome nefrótica apresentou como lesões histológicas principais a GESF, seguida da GNM e nefrite lúpica (p>0,05). Esses achados concordam com os índices dos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo, nos quais os nefróticos são acometidos principalmente por GESF.5

 

 

Segundo Mota (2005)11, em vigência de síndrome nefrótica, na ausência de uma doença sistêmica, os padrões histológicos mais freqüentemente encontrados são o de nefropatia membranosa, GESF ou lesões mínimas. Esta afirmativa pode ser constatada em registros de diversos países, como Cuba4, Cingapura15 e Coréia21 onde a GNLM é a mais diagnosticada nos pacientes com esta síndrome. Em contrapartida, Espanha14 e Itália12 apresentam a nefropatia membranosa como a lesão histológica mais encontrada em nefróticos.

Constatou-se que a GESF e a nefrite lúpica foram, também, as glomerulopatias mais freqüentes nos pacientes que apresentaram hematúria. Em discordância, a literatura postula que a nefropatia por IgA é o diagnóstico histológico mais freqüente nas anormalidades urinárias assintomáticas, como se pode observar na Itália12 e Espanha.14 Esta disparidade também pode ser encontrada em relação a estudos brasileiros, nos quais a nefropatia por IgA, também, se mostrou mais incidente em pacientes com hematúria isolada5. Este fato pode ter ocorrido em virtude de 30% dos pacientes acometidos por GESF se apresentar com hematúria micro ou macroscópica, esta última podendo se manifestar principalmente nos casos onde existir proliferação mesangial mais intensa.25

A GNRP obteve 100% de diagnósticos histológicos de nefrite lúpica, correlação bem caracterizada na literatura. Esta síndrome clínica está diretamente relacionada a classe histológica IV, sugerida pela OMS (1994), que corresponde a glomerulonefrite proliferativa difusa33, sendo este o subtipo histológico encontrado em todas as nefropatias lúpicas biopsiadas neste trabalho.

 

CONCLUSÃO

A escassez de estudos e a heterogeneidade da população paraense em suas características étnicas, socioeconômicas e geográficas reforçam a necessidade de se implementar estudos epidemiológicos sobre glomerulopatias na região Norte para que se possa conhecer a extensão do problema, propor estratégias de detecção precoce, diagnóstico acurado e terapêutica mais eficaz, além de explorar novas possibilidades etiológicas e fisiopatológicas para esse grupo de doenças de alto custo individual e social, por ter como conseqüência a insuficiência renal crônica terminal.

Através dos dados obtidos nesta casuística, foi observado que 81,25% das biópsias realizadas na FHCGV apresentaram diagnósticos histológicos de glomerulopatias. A população estudada foi predominantemente de adultos, da raça negra ou pardos, apresentando um discreto predomínio do sexo masculino. A síndrome clínica mais prevalente foi a nefrótica, seguida de hematúria. Os padrões histológicos mais freqüentes foram a GESF e a nefrite lúpica. A síndrome nefrótica apresentou como principais lesões histológicas a GESF, a nefrite lúpica e a GNM, sendo estas duas primeiras mais prevalentes também na hematúria.

 

REFERÊNCIAS

1. Castro YAM, Núnez LG, Barry HG, Guerrero MA, González LMG. Estúdio clinicopatológico de las glomerulopatías primarias. Rev Cubana Med. 2002; 41(6).

2 . Brady HR, O'Meara YM, Brenner BM. As principais glomerulopatias. In: Braunwald E, Fauci AS, Kasper DL, Hauser SL, Longo DL, Jameson JL. Harrison - Medicina Interna. 15a ed. Rio de Janeiro: McGraw-Hill; 2002. p.1672-82.

3 . Rennke H. O rim. In: Cotran RS, Kumar V, Collins T. Robbins - Patologia Estrutural e Funcional. 6a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2000. p.834-94.

4 . Llanes OB, Abreu JF, Bomboust IP, Cura RC, Salazarte AV. La biopsia renal en el diagnóstico de las glomerulopatías. Rev Cubana Med. 2002; 4(2): 87-92.

5 . Bahiense-Oliveira M, Malafronte P, Barros RT. Aspectos epidemiológicos das glomerulopatias no Brasil. In: Cruz J, Cruz HMM, Barros RT. Atualidades em Nefrologia Vol. 7. São Paulo (SP): Sarvier. 2002. p. 73-7.

6 . Maisonneuve P, Agodoa L, Gellert R, Stewart JH, Buccianti G, Lowenfels AB et al. Distribution of primary renal diseases leading to end-stage renal failure in the United States, Europe and Australia/New Zealand: results from an international comparative study. Am J Kidney Dis. 2000; 35(1):157-65.

7 . Bahiense-Oliveira M, Saldanha LB, Mota ELA, Penna DO, Barros RT, Romão Jr. JE. Primary glomerular diseases in Brazil (1979-1999): is the frequency of focal and segmental glomerulosclerosis increasing? Clin Nephrol. 2004; 61(2):90-7.

8 . Lopes AA, Silveira MA, Martinelli RP, Rocha H. Associação entre raça e incidência de doença renal terminal secundária a glomerulonefrite: influência do tipo histológico e da presença de hipertensão arterial. Rev Ass Med Brasil. 2001; 47(1):78-84.

9 . Rivera F, Gómez JML, Garcia RP. Frequency of renal pathology in Spain 1994-1999. Nephrol Dial Transplant. 2002; 17:1594-602.

10. Castro R, Sequeira MJ, Faria MS, Belmira A, Sampaio S, Roquete P, e col. Biópsia renal percutânea: experiência de 8 anos. Acta Med Port. 2004; 17: 20-26.

11 . Mota PC. Indicações actuais para biópsia renal. Acta Med Port. 2005; 18:147-51.

12 . Schena FP. Survey of the Italian Registry of Renal Biopsies. Frequency of the renal diseases for 7 consecutive years. Nephrol Dial Transplant. 1997; 12: 418-26.

13 . Coppo R, Gianoglio B, Porcellini MG, Maringhini S. Frequency of renal diseases and clinical indications for renal biopsy in children (report of the Italian national registry of renal biopsies in children). Nephrol Dial Transplant. 1998; 13:293-7.

14 . Rivera F, Gómez JML, Garcia RP. Clinicopathologic correlations of renal pathology in Spain. Kidney Int. 2004; 66:898-904.

15. Choi IJ, Jeong HJ, Han DS, Lee JS, Choi KH, Kang SW, et al. An analysis of 4.514 cases of renal biopsy in Korea. Yonsei Med J. 2001; 42(2):247-54.

16. Li PKT, Ho KKL, Szeto CC, Yu LM, Lai FMM. Prognostic indicators of IgA nephropathy in the Chinese - clinical and pathological perspectives. Nephrol Dial Transplant. 2002; 17:64-9.

17. Briganti EM, Dowling J, Finlay M, Hill PA, Jones CL, Kincaid-Smith IPS, et al. The incidence of biopsy-proven glomerulonephritis in Australia. Nephrol Dial Transplant. 2001; 16:1364-7.

18. Rivera F, López-Gómez JM, Garcia RP. Epidemiología de las biopsias renales en Espana. Datos de 1996 y 1997. Nefrología. 1999; 19(2):124- 33.

19. Yahya TM, Pingle A, Boobes Y, Pingle S. Analysis of 490 kidney biopsies: data from the United Arab Emirates Renal Diseases Registry. J Nephrol. 1998; 11(3):148-50.

20. Khajehdehi P, Junaid SMA, Salinas-Madrigal L, Schmitz PG, Bastani B. Percutaneous renal biopsy in the 1990s: safety, value and implications for early hospital discharge. Am J Kidney Dis. 1999; 34(1):92-7.

21. Ministry of Health, Singapore. Overview of glomerulonephritis in Singapore. 2001. Disponível em: http://www.gov.sg/moh/pub/cpg/cpg.htm.

22. Bracons LMC. Biopsia renal y patologia nefrológica. An Esp Pediatr. 2000; 52(5):411-2.

23. Lopes AA, Martinelli RP, Silveira MA, Rocha H. Diferenças raciais entre pacientes com esclerose glomerular focal e glomerulonefrite membranoproliferativa residentes no estado da Bahia. Rev Ass Med Brasil. 1999; 45(2):115-20.

24. Rivera F, López-Gómez JM, Pérez-Garcia R. Papel del Registro de Glomerulonefritis de la Sociedad Espanola de Nefrología: pasado, presente y futuro. Nefrología. 2000; 20(5):41-4.

25. Jennette JC, Falk RJ. Glomerular clinicopathologic syndromes. In: National Kidney Foundation. Primer on kidney diseases. 3a ed. Canadá: Academic Press; 2001. p.129-43.

26. Sociedade Brasileira de Nefrologia. Investigações e tratamento das doenças glomerulares em adultos - recomendações da SBN. J Bras Nefrol. 2005; 27(2 supl.1):3-38.

27. Ayres M, Ayres Jr M, Ayres DL, Santos AS. Bio Estat 3.0: aplicações estatísticas nas áreas das ciências biológicas e médicas. Belém (PA): Sociedade Civil Mamirauá; 2003.

28. Jekel JF, Elmore JG, Katz DL. Epidemiologia, Bioestatística e Medicina Preventiva. São Paulo (SP): Artmed; 2002.

29. Polenakovic MH, Grcevska L, Dzikova S. The incidence of biopsy-proven primary glomerulonephritis in the Republic of Macedonia - long-term follow-up. Nephrol Dial Transplant. 2003; 18(5):26-7.

30. Woronik V, Oliveira MB, Malafronte P, Barros RT. Glomerulopatias em pacientes idosos: aspectos clínicos e histológicos. J Bras Nefrol. 2003; 25(4): 172-8.

31. Chan KW, Chan TM, Cheng IKP. Clinical and pathological characteristics of patients with glomerular diseases at a university teaching hospital: 5 year prospective review. HKMJ. 1999; 5(3):240-4.

32. Cruz HMM, Cruz J, Silva Jr. AL, Saldanha LB, Penna DO. Prevalence of adult primary glomerular diseases: retrospective analysis of 206 ..kidney biopsies (1990-1993). Rev Hosp Clin Fac Med S Paulo. 1996;51(1):3-6.

33. Barros RT, Prado EBA, Pestalozzi MS, Woronik V. Glomerulopatias secundárias. In: Riella MC. Princípios de nefrologia e distúrbios hidroeletrolíticos. 3a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan. 1996. p.305-23.

34. Braden GL, Mulhern GJ, O'Shea MH, Nash SV, Ucci Jr. AA, Germain. MJ. Changing incidence of glomerular diseases in adults. Am J Kidney. Dis. 2000;35(5):878-83.

35. Mirete JO. Reconsideración de la biopsia renal en las glomerulonefritis primarias. Rev Clin Esp. 2001; 201(7):398-401.

36. Balakrishnan N, John GT, Korula A, Visalakshi J, Talaulikar GS, Thomas PP, Jacob CK. Spectrum of biopsy proven renal disease and changing trends at a tropical tertiary care centre 1990-2001. Indian J Nephrol. 2003;13(1):29-35.

37. Hricik DE, Chung-Park M, Sedor JR. Glomerulonephritis. N Eng J Med. 1998; 339(13):888-99.

38. Nadal MA. Avances en glomerulopatias en los últimos 20 anos. Rev Nefrol Diál y Transpl. 2001; 53:27-8.

39. Barros RT, Alves MAR, Dantas M, Kirsztajn GM, Sens YAS. Glomerulopatias: Patogenia, Clínica e Tratamento. 2a ed. São Paulo: Sarvier, 2005. v. 1.

40. Simon P, Ramee MP, Boulahrouz R, Stanescu C, Charasse C, Ang KS, et al. Epidemiologic data of primary glomerular diseases in western France. Kidney Int. 2004; 66:905-8.

 

 

Endereço para correspondência:
Marcelle Nobre Braz
Rua Oliveira Belo, 488.
Umarizal, Belém – PA.
CEP: 66.050-380
Fone: (0xx91) 3242-5523
E-mail:mnbraz@yahoo.com.br

 

 

1Trabalho realizado na Fundação Hospital de Clínicas Gaspar Vianna – Setor de Nefrologia