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Epidemiologia e Serviços de Saúde

Print version ISSN 1679-4974On-line version ISSN 2237-9622

Epidemiol. Serv. Saúde vol.32 no.3 Brasília  2023  Epub Nov 20, 2023

http://dx.doi.org/10.1590/s2237-962220230003000018.en 

EDITORIAL

Agenda de Imunização 2030 e os desafios do Brasil

Cynthia Braga (orcid: 0000-0002-7862-6455)1  , Barbara Reis-Santos (orcid: 0000-0001-6952-0352)2 

1Fundação Oswaldo Cruz, Instituto Aggeu Magalhães, Recife, PE, Brasil

2Rede Brasileira de Pesquisas em Tuberculose, Rio de Janeiro, RJ, Brasil

A queda nas coberturas vacinais e o consequente ressurgimento das doenças imunopreveníveis têm-se constituído um importante desafio global.1 A falta de acesso à imunização e a hesitação vacinal - esta, definida como relutância ou recusa em aceitar a imunização, apesar de disponível - contribuíram para as quedas de cobertura das vacinas em todo o mundo, na última década.2 Esta tendência de redução foi agravada pelas dramáticas consequências da pandemia de covid-19, com impacto contrário aos esforços de elevação das coberturas vacinais, na maioria dos países.3

Em 2022, apesar da intensificação das ações de imunização e do fim da pandemia de covid-19, a cobertura mundial da vacina contra a febre amarela era de 48% nos países endêmicos, e a da primeira dose da vacina HPV nas meninas, de apenas 21%, níveis bem abaixo dos 80% recomendados.3 No mesmo período, o Brasil figurava entre os dez países do mundo, em sua maioria situados nos continentes africano e asiático, onde se concentravam cerca de 60% das 20 milhões de crianças que não haviam recebido a dose inicial da vacina DTP (contra difteria, tétano e pertússis) ou estavam parcialmente vacinadas.2

Determinada a enfrentar essa grave ameaça à saúde global, a Organização Mundial da Saúde (OMS), juntamente com outras instituições parceiras, propôs a Agenda de Imunização 2030 (AI 2030). Lançada em 2020, a estratégia visa maximizar os efeitos das vacinas no âmbito global, mediante o fortalecimento dos programas nacionais de imunização.4 Destacam-se, entre as principais metas da Agenda, ter alcançado a cobertura vacinal de 90% para todas as vacinas essenciais administradas na infância e adolescência, e a redução pela metade do número de crianças com esquemas vacinais incompletos, até o ano de 2030.4),(5)

Para o cumprimento dessas metas, a definição de prioridades, o aprimoramento de estratégias e planos operacionais e o monitoramento dos dados de vacinação no nível local são de máxima importância, visando garantir o acesso a produtos vacinais e a prevenção de doenças imunopreveníveis entre as populações.5

A tendência global de redução de coberturas vacinais, nos últimos anos, acentuou-se no Brasil, durante a pandemia de covid-19, a ponto de ameaçar os resultados e o sucesso do Programa Nacional de Imunizações (PNI), em quase cinco décadas de existência. As análises conduzidas por Moura et al. - utilizando-se de dados do Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI) e do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (Sinasc), apresentadas em artigo publicado neste número da Epidemiologia e Serviços de Saúde (RESS),6 são uma clara demonstração das tendências de declínio das coberturas vacinais e de aumento das taxas de abandono da vacina tríplice viral no Brasil, no período de 2014 a 2021. Tais evidências apontam para os grandes desafios a serem enfrentados pelo país, nos próximos anos, no cumprimento das metas da AI 2030.

Vale ressaltar, no entanto, as potencialidades do PNI no enfrentamento do problema. O Programa, reconhecido pelo mundo, comemora 50 anos de existência, com experiências acumuladas, avanços e sucesso nas metas projetadas e, especialmente, nas dificuldades superadas. Mais além dos aspectos virtuosos, as perspectivas do PNI para os próximos anos foram discutidas em nota editorial da RESS.7 O Programa dispõe de uma estrutura física e técnico-administrativa da rede de frios integrada à rede de Atenção Primária à Saúde, do Sistema Único de Saúde (SUS), em seus diferentes níveis de gestão, em todo o território nacional.8 Salienta-se igualmente, apesar das limitações relacionadas à oportunidade e qualidade dos dados,9 a utilidade, flexibilidade e cobertura do Sistema de Vigilância do Programa Nacional de Imunizações, o levantamento contínuo e o monitoramento dos dados de cobertura e de abandono da vacinação no país, enquanto importante ferramenta para o planejamento das ações do PNI nas escalas local e regional, nos diferentes níveis de gestão do SUS. Não obstante a autonomia nacional na produção de vacinas e sua contribuição para o acesso da população aos imunizantes, persistem significativos desafios tecnológicos e gargalos produtivos, no sentido da redução e eliminação de nossa dependência dos países tradicionalmente produtores desses insumos.10

Ao cenário atual, de aumento da hesitação vacinal e consequente queda nas coberturas, acrescenta-se a disseminação de notícias falsas.11)-(13 Garantir à população acesso universal às vacinas demanda ações complexas e de natureza distinta, como o planejamento e investimento na formação de competências, no fortalecimento da infraestrutura e no desenvolvimento científico e tecnológico, nos diversos níveis organizacionais. Para que essas ações sejam bem-sucedidas e o Programa Nacional de Imunizações recupere a confiança e adesão da população, construída ao longo de tantos anos, é essencial o comprometimento da comunidade científica, de profissionais de saúde, organizações não governamentais e de Estado. Apenas com o engajamento da sociedade organizada, será possível conduzir o país à retomada de sua condição de expoente mundial nas ações de vacinação.

REFERENCES

1. World Health Organization. Ten threats to global health in 2019 [Internet]. [Geneva]: World Health Organization; c2023 [cited 2023 Oct 31]. Available from: https://www.who.int/news-room/spotlight/ten-threats-to-global-health-in-2019. [ Links ]

2. Gonçalves BA, Matos CCSA, Ferreira JVS, Itagyba RF, Moço VR, Couto MT. Hesitação vacinal contra a COVID-19 na América Latina e África: uma revisão de escopo. Cad Saude Publica. 2023;39(8):e00041423. doi: 10.1590/0102-311XPT041423. [ Links ]

3. World Health Organization. Immunization coverage: key facts [Internet]. [Geneva]: World Health Organization; 2023 [update 2023 July 18; cited 2023 Oct 31]. Available from: Available from: https://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/immunization-coverage . [ Links ]

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5. World Health Organization. Implementing the Immunization Agenda 2030: a framework for action through coordinated planning, monitoring & evaluation, ownership & accountability, and communications & advocacy [Internet]. [Geneva]: World Health Organization; 2021 [cited 2023 Oct 31]. 32 p. Available from: Available from: https://www.who.int/publications/m/item/implementing-the-immunization-agenda-2030 . [ Links ]

6. Moura LL, Neto M, Souza-Santos R. Tendência temporal da taxa de abandono e da cobertura da vacina tríplice viral no Brasil, 2014-2021. Epidemiol Serv Saude. 2023;32(3):e2023117. doi: 10.1590/S2237-96222023000300004.PT. [ Links ]

7. Percio J, Fernandes EG, Maciel EL, Lima NVT. 50 anos do Programa Nacional de Imunização e a Agenda de Imunização 2030. Epidemiol Serv Saude. 2023; 32(2):e20231009. doi: 10.1590/S2237-96222023000300001 [ Links ]

8. Ministério da Saúde (BR). Rede de Frio [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; c2023 [citado 2023 Out 31]. Disponível em: Disponível em: https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-a-z/c/calendario-nacional-de-vacinacao/rede-de-frio . [ Links ]

9. Silva AA, Teixeira AMS, Domingues CMAS, Braz RM, Cabral CM. Avaliação do Sistema de Vigilância do Programa Nacional de Imunizações-Módulo Registro do Vacinado, Brasil, 2017. Epidemiol Serv Saude. 2021;30(1):e2019596. doi: 10.1590/S1679-49742021000100028. [ Links ]

10. Gadelha CAG, Braga PSC, Montenegro KBM, Cesário BB. Acesso a vacinas no Brasil no contexto da dinâmica global do Complexo Econômico-Industrial da Saúde. Cad Saude Publica. 2020;36(Supl 2):e00154519. doi: 10.1590/0102-311X00154519. [ Links ]

11. Sato APS. Qual a importância da hesitação vacinal na queda das coberturas vacinais no Brasil?. Rev Saude Publica. 2018;52:96. doi: 10.11606/S1518-8787.2018052001199. [ Links ]

12. Nobre R, Guerra LDS, Carnut L. Hesitação e recusa vacinal em países com sistemas universais de saúde: uma revisão integrativa sobre seus efeitos. Saude Debate. 2022;46(Spe 1):303-21. doi: 10.1590/0103-11042022E121. [ Links ]

13. Galhardi CP, Freire NP, Fagundes MCM, Minayo MCS, Cunha ICKO. Fake news e hesitação vacinal no contexto da pandemia da COVID-19 no Brasil. Cien Saude Colet. 2022;27(5):1849-58. doi: 10.1590/1413-81232022275.24092021. [ Links ]

Correspondência: Cynthia Braga. E-mail: cynthia.braga@fiocruz.br

CONFLITOS DE INTERESSE

Cynthia Braga é editora-chefe da Epidemiologia e Serviços de Saúde e Bárbara Reis-Santos é editora científica da Epidemiologia e Serviços de Saúde.

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